Soba meu


Estive ontem na ilha, nesse pedaço de terra amada
- naquele em que quem dela se ausenta pedacinho leva -
lá matei a minha sede, da juventude sorvi o néctar!...
 
Soba meu,
não deixes falar tanto a amargura, a desértica aridez.
Olha que a saudade que circunda o nosso chão é imensa,
e é dela que nossa alma se alimenta…
 
Nesse imenso alimento dilui-se o amargo sal,
nas águas dessa magia seguiremos sempre jovens,
sempre na reinação macongina!

COMPANHEIRO

Maconge acontece
sempre que vens
com as ideias que tens
e a malta agradece;
sem ti o que existe
é um fio de quimera
e o que subsiste
é o amargo quem dera,
por isso vem,
traz lembranças,
traz outros também:
voltemos a crianças!

EM MACONGE

Volto à fonte dos tempos
às águas livres, à tona
aos livros, aos quedes de lona
e a rolos de contratempos

mas foram os dias felizes
e não as contrariedades
que deixaram verdades
nas minhas matrizes

e algumas em Maconge estão
na lábia linha e lata
na Amizade que ata
a Solidariedade à razão

de viver a Fraternidade
como se todos da mesma idade!

CEIA DE ALTE

Fomos a Alte,
a uma Ceia Linda.
Que nada nos falte,
ainda que ainda

abraços fiquem
nas vozes do fado
e as faces choraminguem
o Sul do nosso lado.

A haver o que nos falte,
que não seja a saudade,
nem que a dor nos salte
de encontro à idade.

Até para o ano,
noite gelada,
à chama do pano
duma capa surrada.

CAPA E BATINA

Certa vez, andava eu
mais ou menos sorumbático,
quando da "Toca" do Liceu
ouvi um "Ei!" majestático:

era o Presidente da Academia,
de nobre porte... a rigor
- vinha dizer se não queria
ter por alma aquela cor.

Capa e batina,
Maconge e serenatas?!
Mas quem não quer de sina
as linhas, lábias e latas

de uma capa a esvoaçar
com um estudante a reinar?!

Finalmente os Presidentes Da Academia foram homenageados

VISCONDES

Ainda não direi, condignamente.
Ainda me soube a pouco:
não chegou verdadeiramente
a verdade ao meu ouvido mouco.

Mas tenho esperança
de ouvir uns gaios
com fortíssima cagança
reunirem ilustres raios
e decretarem a mudança.

Ai tenho, tenho!
Não faz o homem o engenho?

Quando às vezes

Quando às vezes
inesperável e fria
a noite nos cai
em pleno dia,

é bom ter um quintal
um canteiro de pura relva
um ombro de bornal
avesso à sorrelfa.

É bom ter Maconge
em pecúlio da beleza,
na malta daquele longe
que é nossa certeza,

e dizer-lhes: oiçam lá,
mandem avisos
que precisamos por cá
dos vossos risos!

A GOTEIRA SUL DO MEU CHAFARIZ

Inquietaram-me as águas
com um convite:
-"Vamos baptizar um bambu,
filho do Bambu!"

Lá fui, palmilhando asfalto,
remexendo malas de porão,
agitando sombras pousadas
em quindas de então:
duendes que o corpo traz
de águas passadas.

Uma dúzia de nostálgicos,
penso eu. Não era o repasto,
mas aquele Filho do Liceu,
que lá nos levava.. o rasto
indelével da juventude
que aquela planta regeu.

Foi assim, que águas antigas
de fontes das minhas manhãs
voltaram em gotas aspergidas
na benção, ao molhar os tantãs,
esses orgãos que nos traem
quando as saudades nos saem.

Voltei à Serra do meu vento
e revi as folhinas da raiz
onde busco forças e alento
à goteira sul do meu chafariz.

Preclaros Colegas

Agora que vos encontrei
não me deixem escalavrar
a túnica que confeccionei
ao vos abraçar:

aquele manto antigo
de olhar límpido e puro
de falar aberto e amigo
sem dogmas nem muro.

Não deixem que me esconda
na noite ou noutro lugar
a não ser que dele responda
em fado a cantar.

Vão vindo tempos do além
e à floresta do nosso viver
requestada de amor convém
outra lua renascer.

Venham comigo...
Obriguem-me a ir convosco...
O mar não terá sentido
se não nos tivermos no rosto!

Parte um macongino

Parte um macongino,
e com ele uma parte de nós
vai também nesse destino,
porque as rendas têm nós,

e em um se desfazendo
a arte se modifica
e a outro irá correndo
como fio de água em bica,

e os desenhos fendidos
agarram-se aos afluentes
contando casos acontecidos,
cimentando sobreviventes

que falarão do amigo,
e ao vir água cristalina
dirão o que digo
- não me saias da retina,

e falarão do velho leão
como só o faz o coração

D. VERÂNEO JORGE

Por certo viste,
D. Verâneo,
da dor, o sucedâneo,
quando partiste;

de entre as tuas gentes,
como a dor emaranhou
lianas e brotou
- e fomos valentes;

e queremos continuar
rochas valentes, Amigo
- contamos contigo
,não nos deixes vacilar,

e que campos de lírios
e céus reluzentes
sejam sementes
dos teus martírios.

D. PIPO

Na cela da vida foste herói.
Nas planuras do além algo mais serás.
Depois do que cavalgaste "cowboy",
melhores montadas decerto terás.

Quanto a nós, meu amigo,
uma estrela se foi, outra brilha
no silêncio que não levaste contigo:
a amizade que nos ficou de quilha!

Imparável
neste mundo imperfeito,
era a árvore do teu jeito,

e inigualável
neste mundo cão
era o teu abraço irmão.

Adeus D. João Simões,
Marquês da Montipa, «Velho» Companheiro.
Maconge definha na Terra e engrandece-se no Além.
Cumpre a ironia do Berço.


Valério Guerra

D. PIPO

No meio da tanta consternação,
no meio de um silêncio abissal,
afastou-se, sem adeus, nem sermões,
aquele que de todos Amigo foi, afinal,
que a todos recebia com um abração.
Assim, simplesmente D. João Simões.

D. Pipo foi também para parte incerta.

Direito, como sempre, vais, pela certa,
por uma chana do Céu, enluarada,
a declamar a tua poesia tão afamada:

«oh nocheirinha da Vipunga
C'o beco a nocha cai no chão

ai ó Frorinda,
só teus mavero não cai,
ai ó Frorinda,

nos parma da minha mão»

(Ah grande Pipo !!!
Que suave seja a tua caminhada)

NECO

25.10.2007

Não te rales Maconge

Não te rales Maconge,
mesmo quem te diz friamente,
diz oiro-mel de sol
e raízes ternamente,

e não consegue disfarçar
o que sabe da paisagem
com a mente, erva de viagem,
entre a floresta e o mar.

Por isso, Maconge,
tu és todo e qualquer lugar,
onde vás, onde estejas,
há o berço em teu olhar,

há uma Capa que te cobre,
há uma saudade nobre!

MACONGE

Maconge é Reino de Lenda.
Cada contador sua narração.
Burro velho não tem emenda.
Quem o vive doura a tesão.

Por essa subi a parvo:
os elogios comovem
fico abelha em favo
as palavras chovem.

É uma sensação esquisita:
há camaleões em toda a parte,
mudam de cor a cada visita.
Inteligentes chamam-lhe arte.

Tenho medo de inteligente.
Camaleão é gente?