COMPANHEIRO

Maconge acontece
sempre que vens
com as ideias que tens
e a malta agradece;
sem ti o que existe
é um fio de quimera
e o que subsiste
é o amargo quem dera,
por isso vem,
traz lembranças,
traz outros também:
voltemos a crianças!

EM MACONGE

Volto à fonte dos tempos
às águas livres, à tona
aos livros, aos quedes de lona
e a rolos de contratempos

mas foram os dias felizes
e não as contrariedades
que deixaram verdades
nas minhas matrizes

e algumas em Maconge estão
na lábia linha e lata
na Amizade que ata
a Solidariedade à razão

de viver a Fraternidade
como se todos da mesma idade!

CEIA DE ALTE

Fomos a Alte,
a uma Ceia Linda.
Que nada nos falte,
ainda que ainda

abraços fiquem
nas vozes do fado
e as faces choraminguem
o Sul do nosso lado.

A haver o que nos falte,
que não seja a saudade,
nem que a dor nos salte
de encontro à idade.

Até para o ano,
noite gelada,
à chama do pano
duma capa surrada.

CAPA E BATINA

Certa vez, andava eu
mais ou menos sorumbático,
quando da "Toca" do Liceu
ouvi um "Ei!" majestático:

era o Presidente da Academia,
de nobre porte... a rigor
- vinha dizer se não queria
ter por alma aquela cor.

Capa e batina,
Maconge e serenatas?!
Mas quem não quer de sina
as linhas, lábias e latas

de uma capa a esvoaçar
com um estudante a reinar?!

Finalmente os Presidentes Da Academia foram homenageados

VISCONDES

Ainda não direi, condignamente.
Ainda me soube a pouco:
não chegou verdadeiramente
a verdade ao meu ouvido mouco.

Mas tenho esperança
de ouvir uns gaios
com fortíssima cagança
reunirem ilustres raios
e decretarem a mudança.

Ai tenho, tenho!
Não faz o homem o engenho?

Quando às vezes

Quando às vezes
inesperável e fria
a noite nos cai
em pleno dia,

é bom ter um quintal
um canteiro de pura relva
um ombro de bornal
avesso à sorrelfa.

É bom ter Maconge
em pecúlio da beleza,
na malta daquele longe
que é nossa certeza,

e dizer-lhes: oiçam lá,
mandem avisos
que precisamos por cá
dos vossos risos!

A GOTEIRA SUL DO MEU CHAFARIZ

Inquietaram-me as águas
com um convite:
-"Vamos baptizar um bambu,
filho do Bambu!"

Lá fui, palmilhando asfalto,
remexendo malas de porão,
agitando sombras pousadas
em quindas de então:
duendes que o corpo traz
de águas passadas.

Uma dúzia de nostálgicos,
penso eu. Não era o repasto,
mas aquele Filho do Liceu,
que lá nos levava.. o rasto
indelével da juventude
que aquela planta regeu.

Foi assim, que águas antigas
de fontes das minhas manhãs
voltaram em gotas aspergidas
na benção, ao molhar os tantãs,
esses orgãos que nos traem
quando as saudades nos saem.

Voltei à Serra do meu vento
e revi as folhinas da raiz
onde busco forças e alento
à goteira sul do meu chafariz.

Preclaros Colegas

Agora que vos encontrei
não me deixem escalavrar
a túnica que confeccionei
ao vos abraçar:

aquele manto antigo
de olhar límpido e puro
de falar aberto e amigo
sem dogmas nem muro.

Não deixem que me esconda
na noite ou noutro lugar
a não ser que dele responda
em fado a cantar.

Vão vindo tempos do além
e à floresta do nosso viver
requestada de amor convém
outra lua renascer.

Venham comigo...
Obriguem-me a ir convosco...
O mar não terá sentido
se não nos tivermos no rosto!

Parte um macongino

Parte um macongino,
e com ele uma parte de nós
vai também nesse destino,
porque as rendas têm nós,

e em um se desfazendo
a arte se modifica
e a outro irá correndo
como fio de água em bica,

e os desenhos fendidos
agarram-se aos afluentes
contando casos acontecidos,
cimentando sobreviventes

que falarão do amigo,
e ao vir água cristalina
dirão o que digo
- não me saias da retina,

e falarão do velho leão
como só o faz o coração

D. VERÂNEO JORGE

Por certo viste,
D. Verâneo,
da dor, o sucedâneo,
quando partiste;

de entre as tuas gentes,
como a dor emaranhou
lianas e brotou
- e fomos valentes;

e queremos continuar
rochas valentes, Amigo
- contamos contigo
,não nos deixes vacilar,

e que campos de lírios
e céus reluzentes
sejam sementes
dos teus martírios.

D. PIPO

Na cela da vida foste herói.
Nas planuras do além algo mais serás.
Depois do que cavalgaste "cowboy",
melhores montadas decerto terás.

Quanto a nós, meu amigo,
uma estrela se foi, outra brilha
no silêncio que não levaste contigo:
a amizade que nos ficou de quilha!

Imparável
neste mundo imperfeito,
era a árvore do teu jeito,

e inigualável
neste mundo cão
era o teu abraço irmão.

Adeus D. João Simões,
Marquês da Montipa, «Velho» Companheiro.
Maconge definha na Terra e engrandece-se no Além.
Cumpre a ironia do Berço.


Valério Guerra

D. PIPO

No meio da tanta consternação,
no meio de um silêncio abissal,
afastou-se, sem adeus, nem sermões,
aquele que de todos Amigo foi, afinal,
que a todos recebia com um abração.
Assim, simplesmente D. João Simões.

D. Pipo foi também para parte incerta.

Direito, como sempre, vais, pela certa,
por uma chana do Céu, enluarada,
a declamar a tua poesia tão afamada:

«oh nocheirinha da Vipunga
C'o beco a nocha cai no chão

ai ó Frorinda,
só teus mavero não cai,
ai ó Frorinda,

nos parma da minha mão»

(Ah grande Pipo !!!
Que suave seja a tua caminhada)

NECO

25.10.2007

Não te rales Maconge

Não te rales Maconge,
mesmo quem te diz friamente,
diz oiro-mel de sol
e raízes ternamente,

e não consegue disfarçar
o que sabe da paisagem
com a mente, erva de viagem,
entre a floresta e o mar.

Por isso, Maconge,
tu és todo e qualquer lugar,
onde vás, onde estejas,
há o berço em teu olhar,

há uma Capa que te cobre,
há uma saudade nobre!

MACONGE

Maconge é Reino de Lenda.
Cada contador sua narração.
Burro velho não tem emenda.
Quem o vive doura a tesão.

Por essa subi a parvo:
os elogios comovem
fico abelha em favo
as palavras chovem.

É uma sensação esquisita:
há camaleões em toda a parte,
mudam de cor a cada visita.
Inteligentes chamam-lhe arte.

Tenho medo de inteligente.
Camaleão é gente?

VALÉRIO, ÉS UM SOBA A SÉRIO

MEU VATE PENSADOR, ESTÁS A VER,
DO QUE É CAPAZ, A TUA FILOSOFIA?
ESTÁS JÁ NA BOA VIA. EU NÃO DIZIA?
SE O REINO CRESCE, MAIS HÁ QUE FAZER.

ESTAR EM TODO LADO NADA TEM DE MAL.
SEMPRE ASSIM FOI A ALMA DE MACONGE
NADA DE MATERIAL EXISTE, NEM DE LONGE
O QUE NOS MOVE É A AMIZADE UNIVERSAL.

A ÚNICA EXCEPÇÃO OCORREU EM PORTUGAL
ONDE, POR IMPOSIÇÃO DO AMOR FRATERNAL
E DA NECESSIDADE VITAL, SEM PEIAS NEM MEIAS,
CRIOU MACONGE SUAS COLÓNIAS EUROPEIAS

SERIA PORQUE NÃO HÁ REGRA SEM EXCEPÇÃO?
QUE O DIGA QUEM SABE, PORQUE EU NADA SEI,
AINDA QUE SE SAIBA QUE NUM REINO DE ILUSÃO,
COM LÁBIA E LATA TUDO VALE, NÃO É MERMÃO?

MACONGE É TUDO

Ao feitiço da negra capa,
o da natureza fica a perder,
e a ambos ninguém escapa.
O que estou aqui a fazer?

Então, estou a viver o quê, aqui,
que não tenha noutro lado?!
Que orixá há por aqui,
que noutro lugar me seja negado?!

Se a lua é igual em toda a parte,
o que tem Maconge ao luar,
que as árvores recordam obras de arte
e as sombras são silêncios a deslumbrar?!

Se em Maconge tenho o que me falta,
então nada falta a tudo o que tenho,
e, se mais ardente o espírito da malta,
mais longínquo é o que desdenho.

Ora, sem nada de profundo,
respondo-vos ao que estou aqui a fazer:
a engrandecer o meu mundo
neste outro que é meu perder!

Maconge é tudo
e ainda tem tudo para ser!

Conheci, ainda moço

Conheci, ainda moço,
uns sóis de Maconge,
num oásis, daqui bem longe,
quando peso a mais não era osso.

Um, era Rei,
um imbondeiro enorme
cuja flor se consome
onde haja da sua grei;

o outro, seria confrade,
se fosse caso disso
e não régio feitiço
de companheiro sem idade;

foi Vice-Rei, Majestoso,
e deixou-nos o legado
do reino por todo o lado
ser rio augusto e saudoso.

Agora, o Segundo
Vice-Rei, por obra e graça,
não interessa, é da praça,
abriu-nos o Mundo:

Maconge não é Sul nem Norte,
e se o reinado é contestável,
ainda bem, é louvável,
da diferença nasce a sorte,

e neste que temos,
saibamos os outros louvar,
como rios que vão dar ao mar,
o mar de onde bebemos,

saibamos, por Maconge,
fazer o que nos lisonge!

Ao Pipo "Frôre do Mato"

Em Angola havia por todo o lado
Nascia, crescia sem ser esprantado
Cobria kubata, redondo jango
E as chanas do nosso Lubango:
Boca da Humpata, Mapunda, Mukanka
Machiqueira, Tundavala e Palanca.
Os kafeco tirava nele as suas carcinha
Pra fazer xixi ou dar umas kekinha
Enfeitava com ele densa karapinha
Fazia com ele a colorida kimbalinha
Punha dentro dela os ôvo e as garinha,
Mirangolo, fruta do mato, cará e farinha,
Boa nocha perfumada e madurinha
Também levava a vulgar vassourinha,
Caneca d'azeitona medida da fubinha
Pra pesar fruta os prato d'arumínio.
O campo era seu vasto verde domínio
Pastava nele: Makópio, Kandimba, cabrito
Mabata e carraça mardita, ruim
Tanta fartura ki dava, eu nem acredito!
Sozinho não nascia espalhado assim:
Fora por Deus esprantado o belo Kapim
Kota-kota di chá e o kuriangombe bendito!

"Os capim..."

Os capim, os capim danado
Que nasce no monte
Sem ser esprantado...

Ai ó cafeco quem farou a ti
C'as frôr do mato
Não era os capim?...

...

Ai ó Amélia porque estás inchada?
Ai Qui bicho foi, Qui ti mordeu

Foi o marimbondo
Mi deu dois picada
Mi deu dois picada
Mas também moreu

...

Os peito das Carolina
Tem una lenço a tapar
Quando a Carolina anda
O lenço fica a saltar...

...

Tem chipoque, tem chipoque
Tem chipoque nos panera
Tu não come mais chipoque
Qui ti vai dar diaréra...

Tempo de chuva mi dá os frôre
E também fruta mi dá
Os piápia vai e vorta sempre
Um gajo morre já não vorta cá...

...

Oh nocheirinha da Vipunga
C'o beco a nocha cai no chão

Ai ó Frorinda
só teus mavero não cai
Ai ó Frorinda
Nos parma dos minha mão

Maconge Em Alegria

(refrão):
Lá vem Maconge em alegria
Lá vem Maconge par'á folia,
Nascem na Chela as tradições
Que coisa bela par'os nossos corações.

Foi em Maconge que nós crescemos,
Reino bem longe onde vivemos,
É em Maconge que a Amizade
Vem de bem longe como a Verdade;

(refrão):
Lá vem...

E quando a Ceia estiver a acabar,
O Rei Dom Caio vamos lembrar,
E a Dom Mário, o Vice-Rei,
Eu vou dizer que o viró-vira já virei.

(refrão)

Há quanto tempo dura esta Amizade,
Esta Fantasia que é coisa bela,
Assim cantamos nossa saudade,
Capa e batina, Serra da Chela.

(refrão)

Prosápia do Soba (2)

Aproveitando o tempo frio de Janeiro
É sempre pretexto para aquecermos
Estarmos numa Ceia com os seus rituais;
Canta-se o Hino sempre, primeiro,
Para o sumo de Baco a seguir benzermos,
Com viró-vira em honra dos ancestrais.

Se a nobreza do Reino o consentir,
E a malta sempre fixe assim quizer,
Com a sopa, no estômago aconchegada,
Vamos, velhas trovas voltar a ouvir,
Logo após se poisar a tal de colher;
Antes da perca vir bem estufada;

Já tenho saudades do "coitadinho do galo",
Mais do nosso "chapéu aos quadradinhos",
E, se a "velha da ilha" assim o permitir,
O chefe do protocolo vai tocar o badalo,
Para se ouvirem, bem desafinadinhos,
Os cantores que aparecem a seguir.

Quem, depois, quiser botar faladura,
Ou apresentar suas doutas opiniões,
Terá o espaço a tal arte dedicado,
Seja nobre, plebeu ou padre-cura;
Após a sobremesa para os glutões,
SILÊNCIO, que se vai cantar o FADO!

Quadras soltas

Ao ser macongino
sou órbita de um Reino
a face de um Hino
a juventude que treino!

...

Quem Estudante diz
diz espíritos sadios
que Maconge quis
jovens reinadios.

Maconge, Maconge

Maconge, Maconge
se fosses mar
que eu pudesse navegar

ou ter não mão
opaco ou cristalino
ou lã de merino

às ondinhas brancas
e as pudesse afagar
- talvez cantar

seria mais fácil
dizer da Fantasia
do Sonho
em pleno dia

dos azuis que vê
quem acredita na Lenda
e nada tem de prebenda!

A Velha Questão

A velha questão, deixou de ser?
-"O que são os maconginos?
Uns crescidos meninos
que se juntam para beber!"

E alguém diz:

que foi um grupo de rapazes
que a saudade juntaram
e que foram tão audazes
que um Reino fundaram?

que esse Sonho lindo
num mundo se transformou
onde a alma indo
menino outra vez sou?

que essa Lenda
o que tem de saudade
se esbate na prenda
da Amizade?

que a Fantasia
- a eviterna meninice
é uma ousadia
e não uma crendice?

E alguém diz:

que a beleza de Maconge
é o oposto da desigualdade
e que as mãos trazem de longe
o desejo de Fraternidade?...

Alguém... esse alguém...
é certamente ninguém!

Sonho, Lenda e Fantasia

Sonho, Lenda e Fantasia!
Eis a razão
da nossa reinação!
Não a azia

as arcas encoiradas
o despique
as águas enlameadas
de geito Manique.

Sejamos francos!
Olhemos adiante
como panos brancos
protegendo o diamante!

Olhemos o futuro
referindo-nos ao passado
não como um muro

não como razão
de pano encharcado...
que assim se fecha o coração!

Desabafos Meus

Não se é de Maconge
roendo e moendo
nem se vai longe
ofendido e ofendendo.

O que lá vai, lá vai
e o que está é que conta
senão, não se sai do ai
nem se acrescenta algo de monta.

Pelo contrário:
baralha-se a Amizade
o abecedário
a Fraternidade

e a Lata, Lábia e Linha
de agreste definha!

Se Sou Macongino

Se sou macongino?
Não fui mais cedo
porque era menino
e não sabia o segredo!

- "O segredo?"
Sim, as palavras tantas
do fado com o penedo
e a alma nas gargantas;

Os amores de estudante,
O enlevo de uma serenata,
A lua falante!

O sonho que é viver
abraçado a uma capa,
Será bom assim morrer!

Reinação

Se eu pudesse
ai se eu pudesse
o chifre de olongo soprar
e a malta juntar

desde o tempo de D. Caio
até a mim, o mais catraio
aí reinaria... ai reinaria
tão saudável alegria

que o mundo, oh, o mundo
com seu triste bafo oriundo
de quantas vozes inquietantes
voltaria ao que era dantes:

reinação...
reinação!

Porque Não, Porquê?

Soba novo pede nova tradição,
mais ao nosso gosto e maneira.
Novos meus, nas ceias de Portimão.
Que tal arranjarem uma cozinheira?

Que saiba dosear bem o gindungo
um guisado bem apurado, porque não?
Fazer muambas e raspas de pungo.
Começa já e conquista fama, Mermão.

Se quiseres, arranjo-te receitas de pirão,
tendo como conduto um molho dos diabos
tudo do melhor, e só pratos bem apurados.

Para servir, só quando a noite vai alta,
porque ninguém faz um bom mezonguê.
Esse "caldo" danado pra levantar a malta.

Pensa bem, Vitakamba,
porque não? Caramba!

Afinal as Ceias estão caras
E o que servem. Coisas raras?

Vai haver Ceia

Eis que o olongo geme
e as ondas repassam
repassam e enlaçam
estórias ao leme

da reinação
de um tempo já longo
que volta ao coração
nesse chifre de olongo.

Vai haver Ceia...
Alguns casos se irão narrar.
Alguma estória de baleia
no planalto a planar

com tal verosimilhança
que quem não acreditar
deixou de ser criança
e deu em marrar!

Vai haver Ceia...

O Feiticeiro do Nameculungo

Gente, oh! incrédula gente!
das margens deste Arade:
vós que hoje me chamastes
por vontade de Soba crente,
aqui voluntário me tendes,
mais do que por bondade.

Venho à Ceia de Maconge,
não costumo ser convidado;
sou estranho e amaldiçoado,
mas é estreia. Venho de longe...

Venho de terras longas, distantes.
Lá, onde abundam os imbondeiros gigantes;
lá, onde guardam mistério os elefantes,
podeis me encontrar...

Perto do grande rio do Sul,
num oco tronco me abrigo da noite fria.

Não temais a solidão, nos dias quentes da procura.
Chegados, vereis que o tempo vos sobra...

Aqui, os tempos são eternos, para longas caminhadas...
Logo entenderão, porque a velha Gagula de Sabá era minha tia...

Oh! incrédula gente! Gente sem fé!
Vinde, como Duparquet veio;
caminhai comigo ao longo do Cunene,
descalços, até onde as grandes águas se estreitam entre rochas,
e aí repousai, meditando...

Aguardai pelo ocre do ocaso, pela vertigem das cores...
Ouvi ao longe o batuque dos vossos corações...

Suku Yanguê!

À Ceia do Seixal

De novo a Malta se vai juntar
- decerto virá, perto ou longe.
Quando o pretexto é... cear,
basta apelo de Soba de Maconge!

Assim, de novo cearemos,
todos irmãos, lado a lado;
neste Reino em que fazemos
da Amizade valor elevado.

Benzido o vinho à maneira,
servidas saborosas iguarias,
virá talvez boa cantadeira
e lá riremos das picardias!

Ao fim da noite, já tontos
de alegria, vinho e emoção,
felizes, marcaremos pontos
na saúde do nosso Coração!

Peripécias da Juventude

Fui até ao Cristo-Rei
Com a tua prima Irene
O que ela me fez não sei...
Mas ligou-me a sirene.

Lá na Senhora do Monte
Brincava com a Armanda
Atirou-me para fonte
Deixou-me de cara à banda.

Fui com ela p'rós Barracões
Numa noite de lua cheia,
Depois de beijos e apalpões...
Saí de lá sem uma meia.

Na Mapunda havia farras
Até alta madrugada
Se a garota mais agarras
Vais p'rá rua à chapada.

Levei a tua prima Micas
P'rós lados da Tundavala
Na caça estavam os Farricas
Acertaram-me com uma bala.

Lá p'rós lados da Humpata
Vivia uma linda menina
Atirou-me com uma batata
Quando toquei concertina.

Certa vez lá na Palanca
Fui dançar estilo yé-yé
Apanhei com uma tranca
Saí de lá coxo d'um pé.

Nos bailes da Chibia
O pai estava sempre atento
Se a garota p'ra ti se ria
Marcava-se o casamento.

Foi à sombra do Bambu
Que um beijo eu lhe pedi
Mandou-me apanhar no (...)
Mas eu não lhe obedeci.

Fizemos uma serenata
À prima do bispo Eurico
Atirou-nos uma lata
Mais a água do penico.

Com uns copos bem bebidos
Naquela noite de luar
À tua prima pedi cupidos,
Mandou-me ir bugiar.

Fecho aqui as recordações
Das terras da nossa infância,
Se aceleram os corações...
Vamos todos de ambulância!

Pópia do Soba (Faro)

Para ti, estudante huilano
Que estás na Ceia Regional
Espero que nada te falte;
Conta histórias ao teu mano,
Neste canto de Portugal,
Nesta linda serra de Alte.

Que os do teu tempo encontres,
E a alegria em ti permaneça,
Relembrando velhas histórias
Da Chela e dos seus montes;
Que a Ceia te reabasteça,
De coisas boas, de memórias;

E que de manhã, ao acordares,
Estes sonhos não sejam neblina,
Te dêem forças, coragem, afã,
Para viveres e relembrares,
Que a amizade será macongina,
Se é de ontem, de hoje e de amanhã!

As Laurentinas

Avé uvitum
Plini di sumorium
Tuti la maltorium
Está convoscorium

Beneditum sois oh cepium
Que voi ai geratium
Beneditum sois frutorium
Entre los melhoratium

Uvitum minha
Mater do vinhorium
Ficatu junti a nui
Oh bebedoratum

Ahora e na horum
Di nostrum roscatium

Oh Mãe!

Per Baco
Dominus vinho tinto
Que Baco esteja convosco

Hino dos Finalistas do Liceu Diogo Cão

Adeus óh sétimo ano
Adeus óh Serra da Chela
Adeus óh sétimo ano
Adeus óh fita amarela

Óh garotas graciosas
Que nos fitam a sorrir
Das vossas bocas formosas
Atirai um beijo a rir

Viva a malta bandalheira
Do Liceu a fina flor
Não chamem segunda-feira
Professores por favor

Ao passar...

Ao passar o Equador,
Pus o pé, cai à água;
Não voltei a ter calor,
Ando só, com muita mágoa.

Chamaste-me retornado,
Nome que não fica bem;
Diz melhor abandonado,
Trocado por um vintém.

Sou apenas Macongino,
Homem que a sorte não teme;
O meu Reino, eu imagino,
Vai seguro, eu vou ao leme.

Vira ó vira, canto eu,
Lá vai mais uma golada;
Obrigado a quem me deu,
Esta uva bem tratada.

Já Deus Baco me dizia
Macongino, eu não te finto;
Vai bebendo, haja alegria,
Seja branco ou seja tinto!

HINO DE MACONGE

Viva a malta de Maconge,
Viva a malta sempre fixe;
Quem não pensa como nós
Que se mate ou que se lixe, lixe, lixe! (bis)

A malta ganhou a taça,
Sem ter nada que fazer;
Quem quiser ganhar à malta
Tem um osso p'ra roer, roer, roer!(bis)

Eia, avante companheiros,
À estroinice, com afã;
Que os pequenos desordeiros
São os homens de amanhã, manhã, manhã!(bis)

Tomos nós somos lixados
P'rá alegre reinação;
Quem nos quer ver contentados
Não nos fale na lição, lição, lição!(bis)

Viva a malta de Maconge,
Viva a malta sempre fixe;
Quem não pensa como nós
Que se mate ou que se lixe, lixe, lixe!(bis)

Maconge é uma promessa

Maconge não é
um modo meio carola
de extravasar o que se é
com ou sem álcool na tola:

é Fraternidade,
um patamar de elevação
na Solidariedade,
com sua razão
na Amizade.

É uma causa complexa,
nada fácil com certeza,
porém uma promessa
com sua beleza.

Ao Soba de Portimão e à Santa Que O Atura

Mas que chatice...
ter de aturar esta modernice
dos tais ditos computadores
mais chatos que doutores!

Apontemos para Portimão
Carroça a andar, sem confusão,
Nesse tal de dia vinte e sete
Com a malta, ninguém se mete.

Daqui dos lados do sotavento
iremos, p'ra desfrutar o momento
e abraçar a família Guerra

Que nessa algarvia terra
Continua a viver Maconge,
Sonho tão perto e tão longe...

Pópia do Soba (Portimão)

Amizade e Fraternidade

Uma vez, para os lados de Maconge,
havia Ceia, capas negras e vozes de cristal.
Era daqueles sábados de cheiro
a mirangolo e pão torrado.
Os meus lábios não mais tiveram igual.

A noite luzia nos pássaros
(ou eram estrelas?) que por lá andavam:
pousavam... pairavam... gesticulavam,
pareciam abelhas... mas a rainha era Rei.

Nunca tinha visto um Rei,
e àquele, os astros rendiam-se:
no seu reino cabe o universo
mais a imaginação que dele fazemos.

Soube que mais tarde, quando já só às amoras
posso falar desse Rei.
Por isso não me calo!

Falo da voz com adolescente dentro,
do abraço com mar incluso,
do bigode com a piada fresca e pronta...

ah, se fizéssemos da sua paixão uso
e seguíssemos a sua predilecta conta,

era-nos mais fácil entender
porque Maconge não se define
e é universo sem deve nem haver
onde a ausência rime.

Luas de Maconge

Falemos então
das aves santas
- imberbes e outras não-,
que abraçaram às tantas

o Reino mais tudo:
controverso e seu reverso,
isto e aquilo,
e contudo,
maior que o Nilo,
que o Universo

- chega ao além e passará
se algo mais houver.

(Um aparte:
o mundo estudante
não é um qualquer,
é um toque de arte
entre livros e guitarra
homem e mulher!)

E em Maconge eu te digo
que muito erramos
quando abdicamos
da União e Lealdade, meu amigo.

Mas esse é o segredo:
fomos feitos para errar,
para à alma sonegar
a paz de amar sem medo!

Vou a Maconge

Vou a Maconge sem dar por isso
(estou sempre em Maconge),
preso a seu feitiço,

a seu vento sem asas,
chamamento de casas,
pedras negras do Liceu
e capas negras do meu eu.

Não é muito o que disponho,
porém é muito vivo o sonho:

simples... grande,
ainda agora
se expande
com quem vai embora.

Maconge tem dentro
um passado que freme,
a amizade por centro
e a lenda por leme;

é um mar de sinal
que D. Caio nos legou,
uma vaga universal!...
um Reino... onde sou!

Ser macongino

Ser macongino, é ser diferente
É sentir-se sempre menino
É gostar tanto desta gente
É fazer da amizade, um Hino!

1990 - Estoril

No último sábado de Maio
De borla, a malta foi jantar;
Mesas na piscina? Mas que raio!
Pôs-se D. Olavo a refilar.

Mas que merda é esta, repetia
Não se cansando de gritar
Ceia macongina? Quem diria!
E vá das mesas alinhar!

Por fim lá se acalmou,
Cansado de tanto reclamar,
Uns copos de tinto entornou
E a rapsódia pôs-se a cantar!

Emeritus Professori

O "bintóito" lhe chamavam
E não era a gozar,
Tinha a ver com o seu jeito
De vinte e oito pronunciar!

Seu nome, Vasco Coutinho,
Nenhum macongino esquece
Hoje e aqui, tem o carinho,
E a homenagem que merece!

Amigo, com A maior
Este nosso professor
P'ra dar notas, não há pior,
Era forreta sim senhor!

É porreiro companheirão,
Sempre pronto para afarra,
Tem Maconge no coração,
E a vida vive com garra!

Seu nome Vasco Coutinho,
Nenhum Macongino esquece
E é com muito carinho
Que esta homenagem lhe oferece.

Tinham nossas quimeras...

Tinham nossas quimeras tanta côr!
Agora, já pouco esmaecidas,
Continuam ligando nossas vidas
Num símbolo fraternal e puro amor!

Já sobre alguns, na campa, sem calor,
Caiem de nós as lágrimas sentidas,
Pétalas discretas, mas doridas,
Que são desta saudade o seu penhor!

Mas deixemos p'ra trás os desenganos!
Não nos restam, porém, já muitos anos
E há que sabê-los bem aproveitar!

Apertemos as mãos! Por caridade
Nunca deixem morrer esta Amizade
Que uns aos outros possamos inda dar!

Hino de Maconge

Nobre Reino de Maconge
És um berço só de heróis
Vossos feitos vão já longe
Irradiando mil sóis.

Todos os teus nobres filhos,
Sangue da mais pura raça,
Abrirão novos trilhos
Para uma geração que passa.

Pela força dos nossos braços
Conquistaremos o Mundo
E lançaremos traços
De um civismo profundo.

E nos dias que virão
Os livros da nossa história
Terão folhas de emoção
De virtude e de glória.

Somos fortes e valentes
E jovens mui destemidos
Estamos na força bem crentes
E julgamos ser escolhidos.

Para vencer tudo na Terra
Sem vacilar, sem temor,
Pois sendo grandes na guerra
Mais o somos em amor.

Obrigado Meus Amigos

Muito alegres de mãos dadas
Cantando o vira-ó-vira
Vivendo emoções passadas
Amor, que ninguém nos tira.

É alegria incontida
o regresso à tenra idade
em que a vida nos corria
em franca liberdade.

É um grito solitário
Da minha alma torcida
que neste encontro gregário
encontra a chama perdida.

Minha vida de rapaz
Aqui não vou esquecer
Aqui eu serei capaz
De viver até morrer.

Obrigado meus amigos
do fundo do coração
Nunca serão esquecidos
é dito com emoção!

Histórias Do Meu Passado

Pediram-me para contar
histórias do meu passado
mas recuso-me a lembrar
pois fico muito magoado.

Hoje tudo é diferente
nada no mundo é igual
tudo fere a nossa mente
e nos faz bastante mal.

A juventude é doidice
porque ninguém nos atura
e quando chega à velhice
se torna em caricatura.

Ser velho, nada o ilude
É uma caricatura
Da passada juventude
Da vida, que nos atura.

Portanto oh maconginos
desdenhem a caricatura
continuaremos meninos
com amizade e ternura.

Maconge

Maconge,
Oh lindo Maconge,
Um reino de fantasia,
O tempo que vai passando,
Aumenta a nossa alegria.

Maconge é também saudade,
Vamos cantar com calor,
Os versos da mocidade,
Os tempos do nosso amor.

Maconge,
Oh lindo Maconge,
Um reino de fantasia,
O tempo que vai passando,
Aumenta a nossa alegria.

Lubango sempre presente,
Cá longe, neste ultramar,
Cantemos alegremente,
Um dia vamos voltar.

Um dia vamos voltar,
À Fonte vamos beber,
Água pura sem parar,
E depois adormecer.

Refrain

Amigos, amigos, amigos
Vamos cantar
Amigos, amigos, amigos
Vamos recordar

Viemos de longe
Daqui e D'além
Trouxemos saudade
E amor também
Estamos contentes
Aqui reunidos
Diremos presente
E seremos ouvidos

Vamos passar juntos
Alguns bons momentos
Neles dando largas
Aos pensamentos
E as nossas vozes
Far-se-ão ouvir
Quanto ao coração
Terá que sentir

Aquelas paredes
Aqueles doutores
Aqueles caboucos
Aqueles amores
E aquelas capas
Negras ao luar
Cobrindo um espírito
Disposto a cantar
E quando partires
Vais levar contigo
Ainda mais desejo
De rever o amigo
Por isso até sempre
Sei que vais voltar
E dirás presente
Quando te chamar

Eu Ouvi Um Macongino

Eu ouvi um macongino,
Cantar alta madrugada,
Com saber e muito tino,
Trovas à rapaziada.

Ao ouvir cantar tão bem,
Até a Fonte chorou,
Mais tarde, como convém,
O garrafão lá se acabou.

Eu ouvi um macongino,
Cantar alta madrugada,
Com saber e muito tino,
Trovas à rapaziada.

Lubango terra sem par,
Toda coberta de esperança,
Quem me dera lá voltar,
Aos meus tempos de criança.

Aqui canto a saudade,
Das flores da minha terra,
Da vida, da mocidade,
À beira da verde serra.

Eu ouvi um macongino,
Cantar alta madrugada,
Com saber e muito tino,
Trovas à rapaziada.

Macongina de Cepa

Não sei quem foi que me disse
Que a Esperança fez a tolice
De ao chocalho, se agarrar,
Às vezes, por brincadeira
Mesmo à sua maneira,
Ao badalo, vai tocar...

Logo houve quem gostasse
E deste modo falasse:
- Não sei bem, qual a razão
Que os homens deste reinado,
Do presente e do passado
Sempre o tiveram na mão.

Se tudo isto não bastasse
Para que a malta brincasse
Anos, resolve fazer...
Mas tantos! Quem diria?
Não fazê-los, mais valia
Pois poucos parece ter...

Tem cuidado minha amiga
Não vás nessa cantiga,
Pois com anos, eu não brinco
Não vá o Cochá pensar
Que já te pode trocar
Por duas, de vinte e cinco.

A caixa que p'la primeira vez
Um teu bom amigo fez
É coisa de pouco valho...
Mas muito jeito irá fazer
P'rás ceias poderes trazer
Escondidinho, o teu chocalho.

Agora, p'ra terminar
Muitos te vou desejar
E que tenham, sabor a mel,
Do meu sobado te trago
Um espremidinho bago
Do bom vinho, moscatel.

Mukanda

Em Maconge não há monotonia,
Nem se envelhece com a idade,
Semeia-se em cada dia,
Os grãos da solidariedade!

O prazer do reencontro,
E a alegria de viver,
Em Maconge não é um conto,
É uma maneira de ser!

As tristezas do dia-a-dia,
São todas postas de lado,
Quando se vive a folia,
Na festa de um sobado!

Maconge,
É sonhar...
É pensar nos outros, ajudar!
É caminhar pela estrada,
É correr, é ficar parada,
É sorrir na caminhada,
É trabalhar muito,
É não fazer nada...
É cantar, mesmo desafinando,
É estar triste de vez em quando,
É chorar quando apetece,
É olhar um jardim que floresce...
Maconge, é amar!...

O Mico é Bispo...

Dominus vo biscum
Et com spiritum tuo
Domínio dos bispos
E com os espírito, tu, oh
Tu oh, o quê, oh meu;
isso é malta do Liceu.

Geraldino, Geraldes e Altino,
Adrega, Cardeal sem desatino
Joelson, é o Bispo que vem atrás
O quarto é o Bispo Dom Ananás
Junta as primeiras letras, oh meu
GAJO, foi o que esta quadra te deu
Diz meu irmão que ainda falta um
Mico, Bispo do nossa Lubangum.

O Mico pra mim é bem conhecido
Mas como bispo nunca tinha ouvido
Mico da Nicha era nosso Pai
Mas se era Bispo, ai lá vai, lá vai
Seria um escândalo pra toda a maltinha
Porque casou com a querida Laurencinha
Rico, tás feito, ou revelas já
Quem é o Mico, ou confusão há.

Não às Ceias sem Poetas

Agora lá para as Ceias
Deste Reino de Maconge
Ou as bolsas estão cheias
Ou não vamos muito longe.

Mas há que impor o respeito
Nesta velha tradição
Valério e Zé Frade a eito
Sem Poetas, Ceias não.

Mesmo que haja cantores
Fadistas e cantadeiras
Sem Poetas, oh Doutores,
Não devia haver mais Ceias.

Poetas do Reino, cantai
Sem nós, não há Poesias
Ignóbeis nobres, chorai
Sem nós, não há alegrias.

Maviosa é a voz
Da cançaõ em muitos lados
Mas ninguém, tal como nós
Escreve a letra dos Fados.

O Bobo de Herculano
Foi para mim uma lição
A Mãe enganava o Pai
Do Fundador da Nação.

Dona Tareja era traça
Desta epistemologia
Dom Henrique tinha graça
Com os cornos que trazia.

Com o Conde de Andeiro
Andou antes e depois
E o nosso Rei Primeiro
Andou com cornos dos bois.

Nesta guerra de enganos
Deste Reino então fundado
Foi a Espanha o seu Amo
Com o ar de enforcado.

Qual Bula Papal qual nada
Quais sete onças, quem as viu
Também podia ser pai
Do filho que ela traiu.

Por isso lhe deu porrada
Em Arcos de Valdevez
E assim ficou fundada
Esta nossa sensatez.

Que a História de faz-de-conta
Que aqui estou a contar
Foi o Bobo de Herculano
Que a mim a fez chegar.

Não tem grande fundamento
Foi um Bobo mentiroso
Mas ficou o sentimento
Entre a gente deste Povo.

Dos Castelhanos livrou
Esta pobre e nobre gente
Que a Europa juntou
Como era antigamente.

Júlio César e Pompeu
Gengis Cão e Alexandre
E o País que nos deu
O Reino de Camprandande.

Coitados dos Palestinos
Comparados com nós outros
Fomos pra vários destinos
Este, aqueles e aqueloutros...

Aqueles Que Por Obras Valerosas Se Vão Da Lei Da Morte Libertando

Doutor Diogo Mourão Garcez Palha
Médico, amigo, cirurgião
Perdoem-me se a memória falha
Tinha voz sonante, como um trovão
Não morreu, diz comigo a maralha
Está vivo com o bisturi na mão
Lá em cima, no Céu, onde trabalha
Outros é que estão mortos cá no chão.

Esse Céu que para nós quer dizer
Algures em parte incerta sempre estar
É forma de Maconge responder
E o mistério da vida eternizar
Perdoem-me os que não querem crer
Partir é continuar a viajar
Pois se isto não estivesse a escrever
Como é que vos iria explicar?

O César da Silveira abriu caminho
E o Mendonça das Forças se seguiu
O Saraiva foi quem mostrou o ninho
Que do Mucúfi e Mapunda surgiu:
O garboso rio Tchimpumpunhino
Que pró Ruacaná se dirigiu
Recordo também o Doutor Higino
Que aos seus alunos as portas abriu.

E são estas memórias gloriosas
Dos amigos que vamos recordando
Cujas actividades engenhosas
Vão a nossa memória dilatando
Em hospitais e escolas tão briosas
Onde nós, candengues, fomos andando
"Aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando".

mesmo sem me pedires

Necas, mesmo sem me pedires
aí vai uma nova colaboração
Depois diz o que sentires
por esta minha intromissão.

Não me chames de abusado
Tu que és Soba de Maconge
mas deixa que faça o meu bocado,
isto é um "mal" que vem de longe.

De longe vem também baterem palmas.
Quando aprenderá a amiga malta
O Fado de Coimbra só quer as almas
dos que o ouvem. As palmas não fazem falta.

Esta malta tão fixe só tem este senão
Bebem tão bem, comem ainda melhor
se aprendessem as regras seria melhor.
Falam muito, há barulho e confusão.

Obrigam a que, a cada momento, se peça
mais silêncio e mais ordem e contenção
Nem atoque de chocalho, por mal que pareça
mantêm-se na mesma, continua a confusão.

Não há que iludir, o tempo que já vai bem longe
em que bastava tocar a choca e tudo se calava
Sem ordem e sem respeito, para onde irá Maconge?
Ai, se eu fosse Soba, que cargas de porrada eu dava.

Para nós é um escape estas ceias com comum amigos
enche-nos a alma de alegria ao recordar a tradição
mas a continuarmos assim, mais que ceias são castigos
e, tenho pena, é muito difícil para mim, aguento não.

Prosápia do Soba

Os anos vão passando, os cabelos branqueando,
E nós, nestas terras do “ultramar” estacionados,
Procuramos que as tradições, de vez em quando,
Nos permitam recordar episódios, bem marados.

Episódios que vão fazendo parte da nossa hisória,
Deste Reino de Lenda, Fantasia, Sonho e utopia,
Dos sítios e malta de Maconge, da nossa memória,
Dos putos, da Huíla fina flor, da velha academia.

Hoje, tenho a vida a decorrer noutras paragens,
Através da lata, lábia e linha que ainda dura,
(na universidade do Bambu, fiz uma formatura).

Passo o testemunho da orientação deste sobado,
A outro macongino, que recorde do seu passado
As bases e ensinamentos deste Reino de miragens.

Nas Ciências Anormais

Nas tais de Ciências ditas Naturais,
A Manuela era a nossa fera;
Entre chamadas escritas e orais
A Nóbrega estava sempre à espera

De ver a malta atrapalhada,
De nos encher de negativas;
E até, numa resposta meio errada,
As cotações de zero eram efectivas.

Os “marrões” que tiravam positivas
Com qualquer dez ficavam contentes
E a Manuela, sem nos dar alternativas

Sem sorrir, nem mostrar os dentes,
Não ligava nada às preces aflitivas
Dos que já eram repetentes.

Certa Vez… Na Fonte Luminosa

Certa vez, junto à Fonte Luminosa,
Enquanto se preparava uma serenata,
O B’jeu, de forma muito auspiciosa,
Encetou, um garrafão, com muita lata;

Depois de o gesso, sem jeito, partir,
Tirou-lhe a rolha, bem de mansinho,
E o belo néctar tratou de engolir,
Começando tal acto, devagarinho.

O resto da trupe as violas ia afinando,
Dando o tom, tentando as afinações,
Fazendo a lista da ordem das canções;

Ouve-se então um som muito brando,
Que nos deixou a todos estarrecidos:
Cinco litros, de néctar, foram engolidos.

Uma Serenata… Diferente

Estava a malta na festa do Benfica
Quando, após uns viró-viras,
Um corvo, virando-se p’ra um futrica
Perguntou-lhe pelas filhas, giras;

Complacente, o senhor respondeu:
- Oh Ricardo, estão em casa, a dormir,
Ou pensas que, numa noite de breu,
Deviam estar aqui p’ra te ouvir?

O corvo, não gostou mesmo nada,
Daquela fala, daquele desafio,
E pegando na viola, já desafinada,

Traçou a capa, pela rua subiu,
E, mais a berrar do que a cantar,
As filhas do Santos tratou de acordar.

Recordações... do Lubango

Certo dia, lá na Chela, o Cristo-Rei,
Falou assim p'rá Senhora do Monte:
- Eu bem te disse, bem te avisei;
Vê lá bem o que aconteceu,
Ao deixares beber da tua fonte
Essa malta, esses corvos, do Liceu?

E a Senhora, no seu ar angelical,
Aconchegando o seu manto protector,
Sorriu, piscou os olhos aos da Industrial,
Mais aos do Instituto e aos Charruas.
Às meninas de bata com alva cer,
Disse-lhes: - Não olhem muito p'rás luas;

É que o segredo da minha fonte,
Desta água pura e cristalina,
Dá aos rapazes, algo que se conte,
Que é diferente e está encantado;
Deixa-os com um brilho na retina,
Põe-lhes o coração mais acelerado.

Olham-vos de outra maneira,
Descobrem os vossos encantos,
E dizem que em Sá da Bandeira,
Há algo melhor do que estudar,
Há magia, flores, belos recantos,
Há a conjugação do verbo Amar.

Recordações... Inglesas

Ficou famosa aquela aposta,
Antes da sineta anunciar,
Mesmo para quem não gosta,
Que a primeira aula ia começar.

O carrito da professora d'inglês,
Abria a sua porta p'rá frente,
E ela, com grande desfaçatez,
Tirava as pernas, lentamente...

Assim, a malta podia observar,
Qual era a cor da cuequita,
E o tesoureiro, ao sortudo dar,

Alguns trocos, pouca guita.
Na única vez que acertei,
Foi na cor amarela que apostei.

Recordações... Geográficas

Era presidente da Académica,
O nosso professor de Geografia;
P'ra não haver muita polémica,
A malta tinha as quotas em dia.

Certa vez, os juniores perderam
No domingo, com o Ferrovia,
Na segunda aconteceram
Chamadas, de grande agonia;

Os que eram futebolistas
Foram responder à matéria,
E, entre rios e serras esquisitas,

As notas foram de miséria;
Nem a quota em dia lhes valeu,
Naquela segunda-feira, no Liceu.

Nos tempos do Vasco Coutinho

Se a aula de Matemática cair
Na semana, à segunda-feira,
Na véspera convém ouvir
Na rádio, a tarde futeboleira.

É que o nosso amigo Bintóito,
Se a Académica não ganhar,
P'rá matéria não está afoito
E Chamadas vai sumariar.

Quem o número do dia tiver,
Até ao quadro vai andando,
E se a equação não resolver,

O caderno pode ir buscando,
Porque um medíocre vai levar
P'ró papá muito bem assinar.

Faça ponto... ponha bírgula

Nas Físico/Químicas um professor
Só dava lições nos laboratórios,
E se os testes eram de horror
Nas aulas não permitia falatórios.

Sempre de bata suja, o Bírgulas
Trocava o nome da malta;
Se não acertávamos nas fórmulas
Punha-nos na rua e marcava falta.

Quando, no quadro, escrevia equações,
E a cambada, daquilo nada percebia
Tratava-nos com alguns palavrões,

Que fariam corar qualquer tia...
Muito lutávamos por umas positivas,
Mas, na pauta, só surgiam negativas.

Saudades De Estudante

Oh meu Diogo Cão
Liceu que deixa saudades,
Roubaste-me o coração
Tiraste as minhas vaidades;

Olhai oh lindas meninas
Vestidas de brancas batas,
Vêde as capas e batinas
Ouvi nossas serenatas;

Foi na Fonte Luminosa
Que um beijo eu lhe roubei,
A Fonte ficou chorosa,
Outro beijo eu lhe dei;

Nossa Senhora do Monte
Do Lubango a padroeira,
É da tua meiga fonte
Que bebe Sá da Bandeira;

Com o teu riacho corrente
Nenhuma boca há-de secar,
Pois a capa mais descrente
De ti se vai recordar.

Oh meu Diogo Cão
Liceu que deixa saudades,
Roubaste o meu coração
Tiraste as minhas vaidades.

Madeira

Terra dos nossos queridos avós
Viagem que o Pipo alvitrou
Sonho da agenda de todos nós
Que em realidade se transformou...

Vamos festejar os "Barracões"
Morada de heróis em fileira
Com os Freitas, os Nóbregas e os Camões
Assim se fez Sá da Bandeira!

No jantar do Zeca, no Porto,
Na viagem se falou...
Que confusão! Isto vai dar p'ró torto
Logo, para a Esperança sobrou!

Ó Esperança! O preto é aceite pelo Jardim?
Pergunta com ar sério o Cardeal.
Então reserva um lugar para mim
Quero protegê-lo do "Bardina" do Leal!

Reserva feita para o Cardeal
Telefona depois a desmarcar
Óh Meu Deus, preto é sempre igual
Porque, dias depois, voltou a marcar

Tudo pronto! Tudo a postes!
Telefonemas de noite e de dia,
Para saber do Carlos da Corte
Ao Soba de Setúbal, eu fazia!

Toca o telefone! É o faltoso macongino
Estou com gripe, estou fracote...
Não há desculpas meu menino
Faz as malas, vais no magote!

Buraquinho, Buraquinho, contigo me zanguei
Nada disseste, não telefonaste,
Mas estás perdoado e contente fiquei
Com o abraço que no Algarve me deste!

Maconginos na Madeira?
Andava o Vice-Rei preocupado
Tens que arranjar uma maneira
De encontrar o "Carlos Morgado"!

Quem é vivo sempre aparece
Já diz o velho ditado
De tudo tratou com muito interesse
Óh Carlos, o nosso "muito obrigado"!

Malandro nos velhos tempos,
Na Madeira senhor respeitado...
Soba da Ilha! Lembra bons momentos,
Como está diferente o nosso Morgado!!

Foste um companheiro prestável,
Como sempre, desde menino
Procuraste, resolveste, foste incansável,
Um verdadeiro e bom macongino!

Chegou a hora da partida
Tudo alegre e bem contente!
O Vasco e a Fernanda querida
Dormiam um sono inocente!

Foi uma azáfama uma aflição!
Até o bendito táxi chegar
Remela no olho e saco na mão
O Vasco e a Fernanda conseguiram embarcar!!!

Felizes e cheios de emoção
Lá vai a malta p'rá Madeira
O Leal saltitando no avião
Disfarçando o medo dessa maneira!!!

Madeira à vista! Olham todos!!!
Começa o avião a aterrar...
Que suplício, que martírio
O Beto e a Esperança estão a passar!!!

Finalmente seguros no chão,
Lá fomos buscar a bagagem
Uns um saco, outros um malão,
Rumo ao "Alto Lido" como paragem.

Logo depois de as malas arrumar
A Julinha e a Ema saem a correr!
A Ema, orquídeas queria comprar
A Julinha, goiabas queria comer!!!

Saem todos em debandada
Chegou a hora da paparoca
Uns, queriam comer espetada
Outros, papas de maçaroca!

"Eu gramo atum com papas de milho"
Disse o Vice-Rei com ar atrevido!
Boas como o milho, é já sabido
Há muito do seu menu, é o escolhido!!!

18 horas - Instituto do Vinho da Madeira
Visita arranjada pelo amigo Amaral
Logo a Nitas reservou cadeira
Junto às provas do bom boal!!!

O Lelo em castas foi doutor
Não havia quem o calasse...
Pensando ser bom conhecedor.
Como se do 'banga sumo' falasse!!!

Tudo pronto e bem disposto
Vamos começar a excursão
Divididos em dois autocarros
Com guias para a explicação

No autocarro da guia Rosa
Falou-se e riu-se sem parança
Disparates, asneiras e muita prosa
Disseram o Lelo, o Leal e a Esperança!!!

Sempre prontas p'ra folia
Pacatas e calmas, na Madeira, não!!
Riam e passeavam com alegria
A Guida, a Idalina e a João!!!

Camarada, calma e sorridente
Ó Zé! O teu destino é fatal
Mas não desistas! Sê paciente
O teu "karma" chama-se Leal!!!

Com o seu boné e ar pimpolho
Vai o Zé fumando o seu cachimbo
Ó Ana Grima abre esse olho,
Não o deixes sair do teu quimbo!!!

Beto, São, Calinhas, Jovita e Nitas
Na Madeira, quinteto de gente boa
Sempre felizes e muito catitas
Bem dispostos até Lisboa!!!

Conceição, Stock e Santinha
Fizeram todas as provas, aposto!
Guimarães, quem te meteu na cabecinha
Que de ti, eu não gosto?

O Zeca Pinto e o seu amor,
Amor o deles sem igual!
Mas cuida-te Manela, por favor,
Que tens no cachimbo um rival!!!

Foste um bom companeirão
Assim como o teu plantel!
Deste sempre a tua mão,
Obrigado Zé Manel!

Boa bunda, e nada feia
Simpática, alegre e divertida
Ganhámos assim uma Andreia
Levada pela Zélia, a sogra amiga!!!

Por seres compincha e porreira
Disso se aproveitou o Cardeal
Quis- te pregar uma bebedeira
Mas foi ele quem se saiu mal!!!

Calmo e sério o Canduzeiro
Quase sempre a reclamar!
Mas é amigo e companheiro
Não duvidem, podem acreditar!!!

Sorrateiro e de olho aberto
Com um cigarro na mão
Está vigilante o Norberto
Que a Celeste não perdoa, não!

Desaparece o cigarro magicamente
Ninguém o viu... Como assim?
A Nené surge de repente
Tem juízo ó Patalim!!!

O Pintor-Mor connosco está
Sempre pronto para a folia
Largou tudo, veio do Canadá
E consigo, a sua Ana Maria!!!

Chegou belo e bem disposto
À ceia bem acompanhado
Luis Paiva, subiu de posto
De soba de Toronto foi empossado!!!

Rui, amigo do coração
Não sejas tão preguiçoso...
Não me zango contigo, não
Porque és querido e amoroso!!!

Suzete, companheira amiga,
Com todos confraternizou...
Conselheira que a todos liga
Riu, conversou e brincou!!!

Necas, ministro de mais um sobado
Onde com prazer foi festejar...
Na Madeira, ganhou o soba Morgado
Vendo assim o seu domínio alargar!!

Não faças essa cara de espanto
Que contigo estou a brincar...
Não te irrites! Ministro não é santo
E os sobas tens sempre que aturar!!!

Batem à porta!... Quem será?
A Nitas procura a Jovita...
Essa senhora? Já aqui não está!!!
Abre um homem nu, e foge, ela, aflita!!!

Mais uma vez à porta bateram
Pelo mesmo nome vieram perguntar...
Essa senhora? Já aqui a procuraram
A 1ª fugiu, já agora, não quer cá ficar???

"Machico", primeira paragem!
Meia hora p'ra ficar...
Será que há Freitas na paisagem?
Ou Nóbregas por lá a passear???

Ninguém... Nada se encontrou
Todos regressam com água engarrafada
Só o Pancho nas calmas comprou...
Uma rosa para a sua amada!!!

A caminho da "Portela"
Do pau da pncha, a guia falou...
Que outros nomes tem? Pergunta ela...
Ninguém sabia, ninguém se manifestou...

"Pau da poncha ou mexilhote"
Diz ela com um sorrisinho...
Sabendo que havia outro no lote
O tal que se chama "caralhinho"!!!

Na "portela" desembarcamos
Pão de caco se comprou
Depois dos recantos admirados
A boa poncha se provou!!!

"Camacha". Hora do almoço prometido!
Tudo sentado, tudo faminto,
Depois de tudo servido,
Eis que surge um Nóbrega no recinto!!!

Gera-se logo grande confusão!!
Será Nóbrega, ou não seria??
Parecido com a Jovita não era não!!
Louro e olho azul, com o Olavo se parecia!!!

"Cadê" os Freitas?
Por ali nenhum sobrevivia
Diz o Lelo com as suas suspeitas
"com certeza, moram noutra freguesia"!!!

Com as vergas deslumbrada,
A noção do tempo perdeu
A Jovita, já atrasada,
Com mini azulejos apareceu!

Passámos furados, ribeiras e levadas
Atum espetadas e pão de caco comemos
Subimos às nuvens de almas encantadas
E, assim maravilhados, ao "Monte" descemos!

"Senhora do Monte"! Que saudade!
À capelinha fomos rezar...
O nosso passado e a nossa verdade
Ali fomos todos relembrar!!!

Ao "Alto Lido" chegados
Felizes, cansados mas airosos
Depois duns banhos bem tomados
Fomos para a ceia belos e formosos!!!

Chegou a hora da ilustre ceia
Que o Vice-Rei, do luxo reclamou!
Mas não achando em volta, mulher feia
Sereno e calmo se conservou!!!

Na mesa a sua garrafa, o vice-rei queria
Mas logo o director não autorizou
Depois de muita teimosia
Um empregado privativo ganhou!!!

Mesas lindas, com harmonia
Um consomé e uma espetada
Bom vinho, muita alegria
A carne... Era de vaca cansada!!

Mulheres lindas no salão...
A Ema, a Olga, a Júlia e a Nela, encantaram...
A Lucília, a Mª José e a Mª João
Também a Linda e a Zélia brilharam!!!

Começaram. Enfim. Os discursos
Para os professores homenagear
Falou o Traguedo do Mendonça
E, do Higino, nos veio lembrar!!!

João Simões, o nosso pipo
Muito zangado ficou...
Por querer ser o veterinário
Num julgamento que não se realizou!!!

O Leal e o Adrega com o Viveiros falaram
P'ra primo dos Freitas, se fazer passar...
O Lelo está confuso! Os dois conversaram
E já iam tendo muito que falar!!!

O João António muito acanhado
Por primo dos Freitas passou...
Mas seu velho tio desbocado
Logo a Maria João alertou!!!

Uma delicada estrelícia local
Firme e certa por onde caminha
Terna e doce no seu natural
Como sempre, a nossa Laurencinha!!!

Por fim, o discurso da coroa
O vice-rei professores homenageou...
P'ra lembrar toda essa gente boa
No nosso "Bintóito" os representou!!!

Silêncio maconginos! Diz a chefe do protocolo
Vamos ouvir cantar o fado...
Ordena o Grão-Duque de Mocolocolo
Apaga-se a luz e fica tudo calado!!!

Sei que chouriço não tem som
E salpicão... também não
Mas Painho tem esse dom
De nos encantar o coração!!!

Tamanho não é documento
Isso de novo reaprendi
Ao ouvir quanto sentimento
Na voz do António Sousa senti...

Como sempre a nossa Linda
Com a sua voz nos presenteou
Melodiosa e firme ainda
Belos fados ela cantou!!!

E aquela viola tocada
Pelo nosso querido amigo...
Lelo... Nunca a deixes calada
Que nos fica o coração partido!!

E para ceia terminar
Canta-se o fado da despedida
Para em pensamento voltar
Ao Lubango terra tão querida!!!

Domingo! A festa está a acabar!
Cada um fez o que quis...!
Uns, amigos foram visitar,
Outros, passear até Porto Moniz!!!

Stock, Adrega e Amaral combinaram,
Juntos, à noite jantar...
Comeram, beberam e apostaram
Se o Benfica viesse a ganhar...

Como Benfiquista de carreira
Cumpriu a aposta o Amaral,
Apanhou tamanha bebedeira,
Que quase saiu ao colo do Funchal!!!

Chegada a hora da partida
O amigo Leal não sossegava
Mudando o horário de saída
Planos diabólicos engendrava!!!

Com uma certeza porém
Regressamos ao continente...
Pensando no ano que vem
Da Madeira veio tudo contente!

Pancho meu querido anão,
Grande ajuda me prestaste.
Obrigado! Peço-te perdão
Por tudo o quanto me aturaste!!!

ALGUÉM... D.CAIO

Alguém... assim aconteceu,
presumiu o mistério
que das escadas do Liceu
se tornou um caso sério

de alma e sedução,
brio de juventude
e permanente anunciação,
e com tal magnitude,

que embora longe,
mais forte freme
a chama de Maconge,
mais encanta e geme

o Mucufi azul,
e mais os ventos dizem sul.

CEIA MACONGINA

Éem ocasiões destas
que laranjas azedas
fecham as frestas
e reduzem a nulas medas

tristezas enormes,
longos caminhos duros,
horizontes disformes
e altos, muito altos muros,

e as pedras se esboroam
e em asas de pó evoluem
de imbondeiros que voam
a ritmos que nos possuem.

É aqui, entre vós,
companheiros maconginos,
que se adoça a voz
e brilham olhares meninos,

que o ontem tem futuro
e no infinito navega,
e, Parte Incerta... é seguro
ser luz que nos não cega.

PRESIDENTES DA ACADEMIA

Com lata, lábia e linha,
o meu discurso vem preitear,
da malta sonsinha,
os que foram Presidentes a reinar.

Naquele tempo o Mukufi corria
à voz troante de uns quantos
Presidentes da Academia,
e sob os seus negros mantos

cresceu a irmandade
para um Reino também eterno,
este agora, de augusta mocidade,
entre honoris cábula e moderno.

Enfim, sejamos francos,
destas cepas de uva tinta
não se soube de juízos mancos
nem de praxes sem grande pinta,

nem de arco-íris ou jeitosa flor
"malmente" cobiçada,
como não houve mau cantor
nem serenata não afamada,

e a vós, Presidentes,
se deve este reboliço
de tinto e capa serem sementes,
e de Maconge não haver sumiço.

HINO DO SOBADO DE SETÚBAL (*)

Aqui, onde a serra faz lembrar
A majestosa, a imponente Chela,
Guardamos nossas mágoas, por se estar
Tão distante e tão saudosos dela

Em Setúbal onde tudo é tão diferente,
No sobado macongino há união,
Com laços fortes se une toda a gente,
Se reconstrói a Amizade e a Tradição

(REFRÃO)
Maconge dá-nos força e alegria,
Afastando tristezas, solidões,
Reino de Sonho, de Lenda e Fantasia
Enlaça todos os nossos corações

Se te consomem as penas e saudade,
Tuas tristezas, tuas mágoas põe de lado
E vem viver num mundo de Amizade,
Que é para nós de Setúbal o Sobado

Pois se a tristeza o teu Coração roer
Basta o Sobado uma Ceia organizar,
Para a alegria brotar ao reviver
Cenas "Caninas" que temos p'ra contar

(REFRÃO)
Maconge dá-nos força e alegria,
Afastando tristezas, solidões,
Reino de Sonho, Lenda e Fantasia
Enlaça todos os nossos corações

Reino de Sonho, Lenda e Fantasia
Enlaça todos os nossos corações

(*) com a música de "Os Meninos Do Huambo"

Poetas do Reino

Tal como o Esteves, pleno de Mistério,
Fanou logo o bolo, lá no Magistério;
Também a Dom Necas deram a palmada
Duns quantos livritos, mas não foi por nada.
Está-lhes no sangue, é da tradição
Dar uma Palmada, mesmo ao irmão
Maconginos nobres, antes e depois;
Morreram as vacas, ficaram os bois.

Setúbal, grandes partidas me pregas;
Onde faleceu Ramalho Viegas.
Renasce a Poesia nesse teu chão,
Livros de teu Soba, feitos à mão;
São, sem dúvida, um grande Tesouro,
Que valem tão bem o seu peso em ouro;
E os Amigos são como as Estrelas,
Estão sempre connosco e nós sempre a vê-las!

Estou Apaixonado Pelas Macongíadas

Essa menina de Olhos de Diamante
Botou poemas de antigamente, de Dante
Fez-me navegar até aos quintos dos Infernos
Botou-me a ferros, em fogos eternos.

Deixou a minha alma com os Diabos
Atirou-me às Tormentas desses Cabos
Bojadores, Verdes, da Boa Esperança
É uma Maria Lucas que nos lança

Poemas de Dom César da Silveira
Estórias de musas de Sá da Bandeira
Sereias desses rios estonteantes
Volto a ser menino, como (D') antes.

O Diabo vai consumindo meu coração
Os poemas vão-me dando uma lição
Que do Reino da Pura Fantasia
Está reposta a realidade, neste dia.

Maconge não é mais um sonho, afinal;
É um Reino fantástico e Real
De quem tem nas mãos o Coração
É uma Terra de Sonho e Gratidão.

Fui a Setúbal...

Fui a Setúbal, à Quinta dos Vanicelos;
Buscar os livros, que são os mais belos,
Vistos nesta terra tão curta e bela vida
Torrei bem ao sol, espera merecida.
Feitos à mão, computador, sala de Kimbanda;
Trouxe um tesouro, aqui para a minha banda
Made in Casa, de Setúbal Sobado;
Até da Claudinha são do agrado.

É que a Suzete, além de Poetisa
Não deixa o Necas andar à deriva;
É a Santa que atura tal Génio,
Naquela fonte de água e oxigénio;
Tipografia, Gráfica da Huíla,
Lá, em Setúbal, tem o Mumhuíla,
Prensa de madeira com parafusos
Roca de poemas, com tantos fusos.

Fusos dos poemas a tecelar
Fusos horários, sempre a despertar
Tear, a prensa que os livros cola;
Com os mais belos poemas de Angola,
Nunca pensei que é na paciência
Que tem Dom Necas tão pura Ciência.

Conventos

P'los Conventos da infância corri,
p'las escadas do Mundo brinquei;
nos convívios da infância cresci,
nos romances da vida me formei.

Se em Angola por lá me não viste,
se em Maconge por lá não cantei;
se não viste, não digas que não existe,
se não ouviste, nunca tal o ouvirei...

Descubro agora, como agora tu a mim
me descobres, nesta Poesia, assim,
inventando a utopia primeira;

Descobrindo nestas figuras aladas
o sentido das sonhadas fadas,
o valor da Amizade Verdadeira!

Ao Valério Guerra

Valério bardo me chama
elogiando-me a veia gira.
É certo que tendo a que ama
ao lado, bardo sempre se inspira!

De Bardos tem o Reino fartura.
Este que agora se chega
só quer falar com ternura,
é com amor que se entrega.

Do Lubango a Musa bonita
foi de surpresa que me importou
porque alma gémea encontrou.

Se hoje a Vida é bendita
com os Amigos deste Reino
nunca me faltará o treino...

A Água Mata A Secura

A água mata a secura
E o médico, se cura, não mata;
E se esta escrita perdura,
Sai em livro, sem errata.

O médico se cura não mata,
Assim como um copo de tinto,
Em Ceia de malta pacata,
Dá p'ró galo e para o pinto.

A água mata a secura
E dá bom lucro ao Vimeiro,
A do Luso, que dizem, pura,

Dá aos donos bom dinheiro!
Mas o tinto... o doutor Frade
Dá vida ao Guerra, compadre.

À Nossa!

Vamos lá ao viró-vira
À volta de malta porreira
Tenho apontada a mira
À malta de Sá da Bandeira

Lembro-me bem que em menino
Brinquei muito e fui reguila
Com os irmãos do Higino
Valério, Russos... e Muhuila

Mas desse tempo há muitos
Que recordo com saudade
Como se fossem uns mitos

E, espero a oportunidade,
Nem que por breves minutos,
Os possa abraçar com vaidade

Na Ceia de Maconge

I
Pedi aos deuses da Mitologia,
Implorei protecção das musas belas
E Vénus disse que me socorria,
Dando-lhe a Inspiração de mil estrêlas;
Júpiter também disse que me abria
Do seu castelo as portas e as janelas,
Concedendo-me assim lá de tão longe
Falar ao rei sublime de Maconge.

II
Eu, confiado espero ter a sorte
Daquela inspiração que é meu desejo,
Se não naquele reino haverá morte,
Haverá maldição... haverá pejo,
O Olimpo sofrerá um duro corte
Porque Vulcano enfim terá o ensejo
De alastrar tal incêndio temeroso
Que até o deus dos deuses põe temeroso.

III
E Marte em quem a esperança mais palpita
Despejará também enormes lanças
Na própria residência onde ele habita,
Ver-se-ão fugir as deusas e crianças
E lacrimosa a face tão bonita
De esbeltas musas, meigas e tão mansas...
E até Baco medroso e com espanto
Deixará o Olimpo e o vinho a um canto.

IV
Nereidas, dai-me pois o vosso auxílio
E concedei-me os méritos de um monge
Para poder entrar no domicílio
Onde se encontra o reino de Maconge;
Dai-me uma inspiração como no exílio
O que canta saudades lá de longe
P'ra que ou possa p'r'o reino Macongino
Ser amplo na ideia... ser ladino.

V
Eu falo ao rei e à grande corte inteira,
Ao trono de Maconge cuja c'roa
É de D. Caio César da Silveira,
E a toda sua gente, gente boa;
Vou exaltar-lhes de qualquer maneira
A sua obra que não gira à toa,
Vou recordar passagens do reinado
E alguma coisa que já tem passado.

VI
Oh nobres e varões do grande império
Que os povos de tão longe receberam:
Gente do novo Ulisses culto e sério
Que nunca o vosso trono esqueceram,
O vosso nome chega até ao etéreo
E as conquistas que nunca pereceram
Também são conhecidas não pequenas
Por raças amarelas e... "morenas".

VII
Bem sabemos que sois conquistadores,
Pois vossa fama voa pelo mundo,
Conhecemos os feitos sedutores
E o vosso heroísmo tão profundo.
Vos sois ainda mais nobres e maiores
(Porque muito bem sei em que me fundo)
Do que muitos guerreiros triunfais
Porque vós além deles, fazeis mais.

VIII
Tende um pouco de afecto e de carinho
Nas conquistas que são tão violentas,
Vosso dardo atirai-o devagarinho -
Não vá ele fazer feridas sangrentas,
E, se puderdes, cacem o "pombinho"
Evitando outras cenas mais cruentas,
Pois nós temos por um dom mitológico
Licença p'ra fazer jardim zoológico.

IX
E se os meus rogos não possam mover
Do vosso trono tanta majestade,
Deixai-nos qualquer caça p'ra abater
Pois o filho de Ulisses tem saudades
Daquilo que ele não pode esquecer,
Mesmo quando já tenha longa idade,
E vereis que vos deixamos espantados
Por sermos como vós uns bons soldados.

X
Como na corte Olímpica existe
Na vossa une olhares meigos e amenos
Que a tentação não pode... não resiste
De se prender por certos ares morenos,
Nenhum de vós tem um aspecto triste
Ou gesto de alegria ainda pequenos
Pois até o soberano, ouvi dizer,
Por estes arredores se quis perder.

XI
E não sei se por mal ou por verdade
É fama que outros entes maconginos
Vagueiam altas horas p'la cidade
Como doidos e autênticos p'regrinos
E outros enfim que buscam a saudade
Num desabafo entregue aos seus destinos,
Apenas com um olhar sentimental
Mostram do coração o grande mal.

XII
E de noite melancólicas canções,
Que têm qualquer estro domador,
Junto das musas mostram afeições
Do vosso reino tão conquistador.
O próprio rei não falta nos serões
Entregues ao domínio do amor
E essas musas e moças que são belas
Sentem paraíso nas janelas.

XIII
Com certeza que Vénus ofertou
Ao vosso reino nobre dom amoroso
E tanbém com certeza que implorou
A protecção de Júpiter grandioso,
Pois Cupido por vezes já chorou,
Apesar do seu reino ser pomposo,
Porque Maconge a ele já suplanta
No amor que a sua corte tão bem canta.

XIV
Óh Maconginos felizes ofertai-nos,
Ao povo que eu represento e está longe,
Oh rei poderoso que és tão grande pai
(Como Júpiter no Olimpo és em Maconge)
Ofertai-nos também musa e dai-nos
O poder, a graça e um ar que não foge
De nos dar os motivos e direitos
De sermos, como vós, senhores perfeitos.

XV
Pois breve está de nós a nossa ida
P'ra outros sítio, p'ra outras regiões
E não temos sequer lembrança querida
Que mais tarde dê luz aos corações -
Apenas uma hora inesquecida,
Horas que vão passando aos trambolhões
Marcam enfim qualquer recordação
Como de tarde a branda viração.

XVI
Nós queremos, Maconginos, que uma sorte
Florida e de mil cores vos vá cercando,
Já que nós somos barcos em ter norte
A vaguear nas ondas, como errando;
Nós também queremos que essa feliz corte
Cada vez melhor se vá orientando
No sentido da busca mais feliz
E de outras coisas que aqui não se diz.

XVII
Vamos deixar-vos por cerca de um ano,
Curta separação... pequena ausência
Que pode ser o tempo de um engano
Ou tempo de obter muita experiência,
Pois durante esse tempo um bom humano
Pensamento não esquece esta excelência,
Onde viemos ter, como em romagem
E onde vimos boa camaradagem.

XVIII
Quando voltarmos, pois sempre aqui virão
Como sempre os nossos representantes -
Do nosso polo, da nossa habitação -
Terão neles amigos concordantes
Que em chegando a esta ignota região,
Em alegria - feras incesantes,
Já conhecem o seu belo destino
Privando com o reino Macongino.

XIX
Acabo com os votos mui leais,
Oh rei César Silveira, óh corte inteira,
P'ra que as felicidades sejam mais
E p'ra que a corte seja prazenteira
De nobres elementos tão reais...
E p'ra que em tudo, de qualquer maneira,
Se conheça distante, perto ou longe
Que aqui triunfa o reino de Maconge.

Para MACONGE

Neste reino de sonho e fantasia
Com ideais eternos de amizade
Que ninguém altere nunca a harmonia
Da lealdade e afecto de verdade.

Nossa saudade é bela, é de alegria
Os que se ausentam vivem em pensamento
Por nossa terra de além-mar em nostalgia
Não choramos pois está em nós cada momento.

Trovas do Exílio - VII

Já se viam chegados todos à terra
que procurada já por tantos fora
porque duas Ceias já encerra
na sua história vencedora.
Ora, hoje já se vê com que guerra
irão comer a caldeirada de albacora
o macongino que chegado tem adiante
churrasco, arroz-doce e vinho abundante.

E, como a gente vinha a desejar
que o Soba d'Aveiro que ali s'assentava
fizesse o seu discurso a falar
como o Jonas que ali não estava,
fez-se silêncio para aquele começar
a palestra original que só ele ousava.
Todos como que acordados se sentiram
voando nos espaços donde fugiram.

Com a vista turva já olha a planura
das austrais terras que não se compadecem
de longe terem ficado na espessura
dos matos de mutiáte que reverdecem.
Assim se vê o huilano, que a ternura
tinge os gestos que ali permanecem,
perdido na franja da saudade ardente
espargida com vinho entre tanta gente.

O Plenipotenciário Ministro enfurecido
por Baco exigiu que se fizesse julgamento
ao bárbaro que ali se encontrava atrevido
porque não sendo do Reino, com alento
se assentava na mesa onde ceva com alarido
o macongino povo de tanto merecimento.
O Vice-Rei porque a capa negra não levou
o bárbaro Faustino no nosso seio aceitou.

Das muitas histórias que se contaram
à volta da grande mesa em ferradura
que no Deixa-o-Resto concertaram,
destacou D. Canduzeiro a certa altura
a dos churrascos que bem desossaram
num baile da Mapunda. A fartura
de ossos era tal que um cão esfomeado
em baixo da mesa foi logo colocado.

Depois da inesperada tempestade,
nocturna coca-cola que o milagre atento
veio transmudar em vínica qualidade,
a Grã-Duquesa discursou o atrevimento
da Morganda que na negra escuridade
quis envolver o seu real talento:
no Reino de Maconge sempre aconteceu
beber ela o que o Vice-Rei bebeu!

E como foi um corajoso acto
pediu por isso a Grã-Duquesa
que o poeta do Reino de facto
ali declamasse com arte e beleza
em honra de quem vindo do mato
ousara desafiar a realeza.
Em mufia cantou logo o trovador
sendo o Duque do Chaungo o tradutor.

Chegado era o momento prometido
em que o Grão-Duque já aguardava
que o Campino, à sua voz submetido,
se ouvisse como bem se esperava.
Sobre o trono se elevou comprido
e por cima de nós bem declamava
o ribatejano que ganhara fama
perdendo-a agora o bravo cuanhama.

Logo que a última sílaba do "Campino"
deixou de se ouvir na noite alta
e do touro ribatejano o trágico sino
deixou de tinir e se pôs em falta,
lançou-se o trovador como um felino
para o meio do salão onde estava a malta.
Saltou e dançou como um pastor muíla
em homenagem às gentes da Huíla.

Da terra africana lhe respondiam
as lembranças que na alma lhe moravam,
que sempre nos seus olhos traziam
quando de sua terra se apartavam.
Naquela noite que os canculas se ouviam
os gestos ritmados celebravam
as chanas onde os bois às centenas
eram pássaros de coloridas penas.

Trovas do Exílio - VI

Quando a tarde passar, na comboiada frota
com grande alarido em verso cantada
achareis os maconginos que a tão remota
terra aveirense agora vão de abalada.
Qualquer então consigo cuida e nota
nos sobados a praxe mais ousada,
e como os que de fora do Reino cresceram
sem a força da tradição que outros conheceram.

Vede quantas carruagens nesta viagem
que fazemos, transportam as subidas
ideias que em outra distante paragem
foram pelos antigos veteranos concebidas.
E do primeiro comboio que passagem
faz agora por estas terras insofridas
nós faremos de improviso em tempo incerto
um épico canto sem limite certo.

Na Ceia-Grande de Aveiro se viu
velhas e novas gentes d'outra enseada
onde o Caculovar se enchia, nem outro rio
tanta fama logrou ver por si apartada.
O Duque do Chaungo tomado de súbito frio
à pipa do doce néctar deu uma olhada
pois a costa de corsários estava cheia
donde já se via latejar a tinta veia.

Os Sobas e Macotas liam já os sinais
que no fundo dos copos o macau deixava ver
e as libações a Baco eram cada vez mais
com o líquido santo sem parar de correr.
Lindos eram os olhos das Vestais
onde transparecia a felicidade de poder
abençoar os antigos Bispos do Liceu
onde, por tanto tempo, o chicoronho acorreu.

Os filhos do Mondego a capa escura
sobre os ombros trouxeram e cantaram
por memória eterna e mui segura
o fado de Coimbra que ali transformaram
em tributo precioso de fonte pura.
Agradeceram os maconginos e choraram
por ouvirem a balada e o fado com fervor
porque eram belos os versos de amor.

Levantando-se o estrangeiro rubicundo
a gaguejar na língua hispana
nos disse: A vós que sois d'outro Mundo
da longínqua e formosa terra angolana,
eu vos testemunho o prazer profundo
de quem vindo da pátria peruana
tanta amizade junta nunca viu
nem tão forte comoção sentiu.

Do Porto a embaixada com seus instrumentos
que pelos etéreos paços vão soando,
no Sobado tocam doces lamentos
que a todos vão suavemente reconfortando.
Um súbito silêncio atordoou os ventos
pois o Barão das Cordas Lisas murmurando
palavras muflas com súbita euforia
inseriu-as no fado com real mestria.

Trouxe o filho de Camuhóque do Céu
o fogo que acendeu no peito humano
quando de improviso a sala dele recebeu
as palavras do Guerrilheiro sem engano.
Assim o Soba comovido agradeceu
o novo título, e o Vice-Rei ufano
ordenou que para sempre a humana geração
recordasse essa nova e nobre condição.

O Barão do Tchimpumpunhime com a vaidade
que com equilíbrio lhe modela a fantasia
leva o Povo ao seu palácio onde a qualidade
da sua bela garrafeira surpreenderia
até o Deus Baco (oh! Leviandade!)
O líquido que borbulhar ali se via
era tanto e de tão estonteante sabor
como não havia em África, Pérsia e Cananor.

Vimos estar todo o Maconge determinado
em fazer de Aveiro terra gentia
um novo e distinto Ducado;
e ao seu Soba Grande, o valoroso Chibia,
Duque do Chaungo, ser-lhe dado
o título por mor de sua valentia.
Que os Trovadores cantem em lindo verso
por todo o Reino ora tão disperso.

E sendo assim, que a explosão da amizade
entre nós maconginos sempre aconteça,
pois estaremos prontos na adversidade
que por guerras à Grei se ofereça,
e o nosso Rei, D. César da Silveira, há-de
da parte incerta onde quer que permaneça
abençoar a nossa boa gente
em plaga estranha abandonada infamemente.

O Duque do Chaungo, forte ficara
imitando os antigos nobres na ousadia
de quem por bem já há muito experimentara
em Grandes Ceias que o tinto tingia
de rubra cor; e o muíla batucara
em honra do dilecto filho da Chibia,
e mais quando os do Lubango em vão tentarem
sorver mais do que ele, e longe ficarem.

A corneta de chifre de olongo num lamento
imagem da guerra fez nos ares;
o som bélico daquele instrumento
que os deuses africanos d'outros lares
abençoaram em feliz momento,
confundiu o caputo (nos seus) esgares
porque não compreendia o cerimonial novo
que ali fazia o macongino povo.

Trovas do Exílio - V

Sempre eu cuidei, ó Grão-Duque poderoso
que, para as coisas da nossa gente,
eu estaria sempre lesto e operoso
a fazer estrofes, onde a poesia em corrente
fale das alegrias ou do caminho doloroso
que connosco vai seguindo obediente.
Assim do Reino cantarei o novo e o velho
como no Lubango ensinou D. Rui Coelho.

Na matutina luz, o Visconde de Maconge fazia
os Macongíadas de ilustre fama
enquanto a lua no céu da Huíla aparecia
aquecendo os corações em cálida chama.
O estudante da capa na noite surgia
para fazer uma serenata à meiga dama
que no colégio olhava da janela
para o Cristo-Rei, guardião da Chela.

Já pelo ar a imagem huilana bem voava
para no écran fixar a benesse
que o macongino no coração levava.
Com o olhar solto que não falece
a magia explode e o encanto ousava
colocar onde o pinheiro se enrijece
o mutiáti, a mupanda e o imbondeiro
e do manhéu o forte cheiro.

E disse mais D. António naquele momento
ter vendido por 17$50 o seu casaco santo
para poder ir à primeira Ceia, e o pensamento
refugiou-se no velho Liceu sacrossanto
onde as carecas dos caloiros doutro tempo
gemiam ao jugo dos veteranos de negro manto.
Viva a malta do chicoronho Liceu!
Viva a malta desse sonho que se não perdeu!

A noite ia passando, na festiva rota
com alegria de saudade misturada
por acharem os maconginos a terra tão remota
a nossa Huíla há tanto tempo abandonada.
Qualquer então consigo cuida e nota
ser caprandanda gente no Puto exilada
esta que aqui e agora canta e bebe
o vinho que desta terra gentia bem recebe.

Os filhos e companheiros de Tebano
que tão diverso néctar nos deixou
ouviram de seguida o discurso ufano
de quem palavras duras arremessou.
A Grã-Duquesa quebrara o "silêncio" insano
que o protocolo desde há muito fixara:
Pelas mulheres maconginas foi exigindo
que o facho do amor a todos fosse unindo.

Trovas do Exílio - IV

Da parte donde a noite vem morrendo
com Sines se avizinha; mas o rio
que do interior alentejano vai rompendo
enche a mulola onde o Vice-Rei teve frio
quando a tipóia real se ia perdendo
no tabaibal imenso do vasto senhorio.
O Baronete lembra-se já das arenosas
terras do Namibe, tão saudosas.

Pelo chão escondido a tipóia real
aos solavancos ia andando na terra dura
tão áspera eram as picadas, por sinal
bem próprias para tudo o que é aventura.
Envoltos todos na poeira fina do areal
anseiam já, esfomeados, pela mansão segura
onde o banquete com manjares desusados
apresenta chincúio, bacalhau e patos estufados.

O grão-Duque do Lubango determina
com palavras altas de Louvor
que um antigo macongino se destina
a ocupar um alto cargo de pendor:
Ministro Plenipotenciário será a sina
de quem até hoje foi Itinerante Embaixador.
Parido no Deixa-o-Resto por Decreto-Lei
espera-o a Fama e a Glória na nossa Grei.

Levantando-se D. Canduzeiro meneando
três vezes a cabeça branca e descontente,
a voz pesada aos poucos engrossando
vai chegando até nós solenemente.
E disse ao Secúlo de aspecto venerando
antes preferir ser Embaixador da plebeia gente
do que contentar o Vice-Rei com o ofício novo,
ser ministro de nobres e não do povo.

Lançando a mão de uma caixa que continha
suspiros de neve da D. Alexandra Portela
o Plenipotenciário Ministro como convinha
distribui os doces pelos nobres que amá-lo
passaram, porque na memória o gesto se retinha.
E as cornucópias do Gavino, ao recordá-lo
D. Saraiva d'Oliveira falou de sua fama
na Huíla, o Grão-Sobado que se proclama.

Também foi vista imagem acesa
de Moçâmedes, a flor d'areia se apartando
no corpo levando a Welwitchia presa
qual polvo verde da secura triunfando.
O namibeano deserto ia com firmeza
do corpo fresco do Planalto s'encostando
oferecendo sua fauna rica e diferente
num alambamento enorme ao Poente.

A Torres Vedras proclamou o Soberano
Mulemba Frondosa de copa rara
onde se refresca o sedento humano
e se banha na água doce e clara
aquele que veio do sertão africano.
Ali, onde o divino néctar molhara
num Oásis gargantas mil
dois meses iam para além d'Abril.

Vou cantando o Povo que se admira
por ter vencido a guerra que o assolou.
Mesmo em terra estranha as forças tira
do corpo que longos caminhos calcorreou
Neste ano que cem cacimbos o Lubango atira
ao Destino que duramente o marcou,
o Povo acalenta a dor nos maconginos braços
fortes na tradição dos chicoronhos Paços.

Vai de vira, ó vira, ó vira, ó vira
mas que grande e belo compinchão
que bem comporta e longe atira
na garganta seca o meu quinhão!
Primeiro camarada, ó vira, ó vira,
ó que calor, que gostosa sensação,
e o Baronete do Namibe compõe na lira
a canção que a Grã-Duquesa lhe pedira.

E agora, de nomes probos e de usança
novos e vários são os habitantes:
o Barão das Mornas o copo já avança
para o líquido de vapores estonteantes
e o "Príncipe dos Trovadores" lança
no pergaminho palavras ressonantes.
E a manhã foi nascendo sem cor
pois desmaiada estava já a poética flor.

Trovas do Exílio - III

De Coimbra a Musa partiu a exercitar-se
nas Terras Altas da huilana Minerva
e do Mondego fez passar-se
a pisar da Planalto a fértil erva.
Quanto pode do Choupal desejar-se
tudo o soberbo Apolo ali reserva.
Aí as flores são tecidas a ouro
e o capim é sempre verde louro.

Nobres sobados o chicoronho edificou
chitacas, arimbos mui seguros,
e quase o Reino todo transformou
com edifícios grandes e altos muros.
Mas depois que o Feiticeiro da Guerra cortou
o fio de seus dias já maduros,
foi-se a Terra, veio a fuga desordenada
e para a hispânica eira foi de abalada.

Nunca com outras Razias gente tanta
veio o lusitano campo enchendo.
E o Reino de Maconge os Deuses ora espanta
por a todos unir num abraço estupendo,
a huilana gente do bárbaro fugindo levanta
a tocha arrancada ao abraço horrendo
da Morte. Ao longe o fumo espesso da granada
a esventrar toda a terra civilizada.

Agora que as Ninfas do Mondego se calaram
Se alevantem as Caculovádis1 da Morte escura
Pois as lágrimas choradas se transformaram
Por memória eterna, em fonte pura.
O nome lhe puseram, os que por ali passaram
de Senhora do Monte, que inda dura.
Vêde que fresca fonte rega as raízes
dos Maconginos, mortais felizes.

E vale a pena cantar o poderoso Reino-Império
que das terras de Maconge ao Cuanhama
D. César da Silveira sem vitupério
conquistou com garbo e gloriosa fama.
Vós, poderoso Rei, que do assento etéreo
onde subiste, a bênção sobre nós se inflama,
Vêde dos chicoronhos feitos valorosos
entre caputos feros e numerosos.

Os Sobas e os Lengas lembrados
que, do Austral planalto huilano,
por rios nunca dantes atravessados
passaram para além do mato africano
em feitiços e macas esforçados,
mais do que aguentava o querer humano,
e entre lusitanas gentes edificaram
Novo Sobado, que tanto sublimaram.

E também as lembranças gloriosas
daqueles pioneiros que foram calando
a sede da bulunga que em terras grandiosas
do Lubango e da Chibia andaram devastando,
e aqueles que por ressacas famosas
se foram da Lei da Morte libertando.
Cantando espalharemos por todo o lado
se a tanto nos levar o poético brado.

Cessem do tripeiro ferino
as brutezas grandes que houveram.
Cale-se dos alfacinhas e do coimbrão ladino
a fama das tradições académicas que tiveram,
que nós cantamos o peito ilustre macongino
a quem Baco e Cupido obedeceram.
Cesse tudo o que a Musa portucalense canta
que Outro clamor mais firme se alevanta.

Eis que o Novo Rei se mostrou
D. Saraiva de Oliveira, o primeiro
deste nome que ao Reino adiantou
colocar no caminho verdadeiro:
do tempo do Caprandanda já cantou
a tradição do Macongino inteiro.
O Soba de Aveiro e o Barão do Tchimpumpunhime
ousarão aumentar o Reino para lá do lime.

E o poderoso Rei, a quem do Planalto puro
foi da mapundeira tradição concedido
impor ao macongino povo seguro
nobres títulos que o farão conhecido
em todo este Continente duro.
E com seu porrinho real e temido
na magnífica Ceia investiu os novos sobados
aos filhos da Huíla nobilitados.

E disse: Ó macongino ousado, mais que quantos
no mundo souberam fazer académicas cousas,
tu, que por baptismos afogados, tais e tantos,
e por julgamentos vãos nunca repousas,
pois as sagradas cerimónias e quebrantos
como carrasco investir ousas,
que há tanto tempo o caloiro teme
que ainda não o sendo, já geme.

Pois são tão importantes os segredos escondidos
da nossa gente e do seu grande alento,
a nenhum outro humano concedidos
de nobres e de imortal merecimento.
Que os cavaleiros desta távola sejam espargidos
com o nompeque perfumado do sentimento
para poderem cantar a Huilana Terra
lá longe ferida por fratricida guerra.


1 Ninfas do Caculovar

Trovas do Exílio - II

E na embala do Vice-Rei mais se ouviu
dos feitos dos barões que o Reino dilataram
e até das palacianas intrigas se permitiu
que fossem em verso cantadas e provaram
não ser certo o que antigamente se ouviu
em cochichos que outrora se espalharam:
Nunca o Vice-Rei o Título de Soberano
ousou retirar ao dos Suseranos o Suserano.

E também se contou que a ímpia gente
do Mar das Antilhas, a Senhora do Monte roubavam
deixando a branca capelinha num repente
sem a imagem que os naturais tanto amavam.
Levantou-se então um brado tão potente
do peito dos muílas que ali estavam
que os estrangeiros recuaram sem tardar
colocando a veneranda imagem no seu lugar.

Ainda os filhos do Mucúfi o exílio escuro
não conheciam ou nele pensavam,
na huilana terra de clima ameno e puro
a feroz jornalista Fernandina julgavam
na solene escadaria de mármore duro
onde os nobres do Reino se assentavam.
Depois que D. Adrega, Bispo santo perdoou
a inimiga depôs as armas e chorou.

Que este Reino da fantasia e da lenda
permaneça pelos tempos sem parança
pois em seu espírito é banhada a legenda
que o Duque do Chaungo ora avança
alevantando a sua bandeira estupenda:
acima o Reino de Maconge que a rubra lança
se espete na armadura azul do firmamento
para que a sua glória não caia no esquecimento.

Trovas do Exílio - I

Eis o Grão-Soba que na embala primeiro
habita, o Vice-Rei de Maconge em iluminada
sala observa e ao bardo macongino, por inteiro
lhe narra os feitos da invencível armada
que em outros tempos o Cunene viu fragueiro.
Dos mundimbas se ouviu a poderosa batucada
lá na Oncócua feudo da alvoroçada gente
que se estende pela savana até ao Oriente.

Se os velhos pioneiros que andaram
tantas terras para verem os segredos delas
no florido planalto da Huíla se ficaram
por certo nós hoje faremos dos sonhos as velas
que com o vento da tradição se insuflaram.
Rumaremos às novas gerações e as virgens telas
pintaremos em chicoronhas tonalidades
a História feita em angolanas idades.

E deu-me o Vice-Rei do seu trono licença
para narrar em verso bem acabado
o famoso acontecimento que sem detença
faço agora de ricos versos adornado.
Do Dongue, seus vassalos de fortuna imensa
foram feitos sobas no mungambo condado.
O ilustre Muhona feliz bem recebe
enquanto a turba contente come e bebe.

A batucada foi tão forte que usada na guerra
ao inimigo os mungambos fizeram dano;
e assim, não tendo já a quem vencer na terra,
vão em grandes saltos acometendo o oceano
de capim que s'espalhando até à finisterra
faz da chana a pátria eleita do africano.
E já se vê de ceptro sobal, maboque e piteira
o Soba Donguense D. Carlos Marques Vieira.

MACONGÍADAS – Canto Quinto

I
Falo, agora, de Lady Anabela,
Lady Aiva, primeira do harém,
Que tem o Vice-Rei sob tutela,
Que ao pé do Vice-Rei parece bem!
Casal que, pelo reino, sempre vela,
Apesar do seu paço em Santarém!
Que a Parca os olvide muitos anos,
Que não nos traga, já, mais desenganos!

II
O Nosso Vice-Rei tem D. Olavo
P’ra seu braço direito e com razão!
Faz deste um seu amigo, não um escravo
E seu representante sempre à mão;
Mesmo nas horas de maior agravo
O Godinho lhe dá satisfação!
Agora, falarei seguidamente
De outros, por motivo bem diferente!

III
O Zito é o cantor e violeiro,
Já que não se fabrica o alaúde!
D. Patalim – o Bispo a “copo” inteiro, –
Quando a beber nos reza p’la saúde!
O Pipo, especialista em cancioneiro,
Que não renova e trata como grude;
O Rui que há de meter sempre o bedelho
Convencido que é gente, não Coelho!

IV
Da velha-guarda há vários vivos inda:
A Zélia mais o Mário, eternos azes,
Não desprezando a fama sempre infinda
De serem os melhores entre os capazes;
O Corte e o Oswaldo na berlinda,
A Alda, que era alta entre os rapazes,
O César Paulo que calcou a lira,
O Jorge e o Ferronha, malta gira;

V
O Bentudo, careca e narigudo,
Mário Andrade e o Boi-Ápis preguiçoso;
O Zé Ninguém que negoceia em tudo
Desde que ache o negócio proveitoso;
O Rui Seca, a sorrir, nada sisudo,
Contador de aventuras que dão gozo,
O Cláudio, o Verânio mais o Pratt!
A memória já falta e mais não dá!

VI
Garotas adoráveis do meu tempo
Sois hoje, mães, avós, mas sogras não,
Que a bondade do vosso temperamento
Não permite tão negra aberração!
Sei qu’inda soltais mais do que um lamento
- Que faz doer bem fundo o coração –
A recordar o beijo que se deu
Com o vosso namorado do Liceu!

VII
Outras gerações se sucederam
Que deram a Maconge brilho eterno,
Páginas saudosas se escreveram,
Sempre prenhes de espírito fraterno!
Sabem todos quem são e conheceram
Já do tempo de antanho ao hodierno:
O Pilhas, o Amaral, o Marques Pinto,
O Inês, aveirense – sou sucinto! -,

VIII
Não podemos esquecer o Ananaz
Que com a sua Mali, lá em Leiria,
Mostra à saciedade, que é capaz
De organizar, da noite para o dia,
Uma farra que a todos satisfaz,
Cheia de cor, de graça e alegria!
Mas outros há, de idêntico valor,
Pois Maconge de génios conta um ror!

IX
Torres Vedras – o Sérgio, diligente,
Não dorme, sempre pronto a trabalhar!
E dentre tanta, tanta, tanta gente,
Outro nome é forçoso recordar!
Seria uma injustiça, era indecente
Que aqui me esquecesse de indicar:
O Vinhas, residente no Seixal;
Nas festas que organiza é bestial!

X
São alguns dos exemplos a apontar!
Peço perdão pois inda há muitos mais
Que gostaria aqui de mencionar,
- Não cabiam seus nomes nos Anais –
Razão porque tive de encurtar
O rol de outros tantos, tão leais!
Não podia deixar – ficava mal –
De falar de Maconge em Portugal!

XI
A chama continua sempre acesa,
O facho continua a rebrilhar!
A malta está unida e bem coesa,
“Per sécula” se assim continuar!
Com vontade, com fé, sem tibieza
Para sempre os seus laços reforçar!
São prova, duma forma bem cabal,
Leiria, a Parede e o Seixal!

XII
Apraz-me registar, com muito apreço,
Nas nossas reuniões, nossos repastos,
A presença de Mestres que conheço,
Alguns de anos cansados e já gastos,
- Que são da vida o seu eterno preço –;
A Cerveira, Simões e outros, fastos,
A Céu e o Higino sempre afoito
Sem esquecer o Coutinho – o Binte e Oito – !

XIII
Não só à comezaina se limita
Nossa Camaradagem e Amizade!
A sêde de entre-ajuda é infinita,
Como infinita é nossa saudade!
O macongino sabe e acredita:
- Não é pura ilusão mas, sim, verdade –
Se precisar, todos lhe dão a mão!
E conta em cada peito um coração!

XIV
Também somos felizes co’a certeza
Que a saga de Maconge se propaga!
Exuste sempre a taça em nossa mesa
Onde bebe o estudante. A sua paga
Limita-se à promessa, com firmeza,
De outros trazer, numa crescente vaga,
Transmitindo, aos vindouros, o destino
Do que há de bom no berço macongino!

XV
Há um marco a referir neste reinado,
Que se deve exaltar, enaltecer:
Viagem a Macau, tão afastado,
Que fomos abraçar e conhecer!
O Vice-Rei mostrou o seu arado,
P’la forma como sabem receber:
Com carinho, com pompa e circunstância,
De nostalgia eivados p’la distância!

XVI
Prestou-nos homenagem o Senado
- Leal Senado um nome conhecido –!
Tal gesto de lhaneza há calado
No nosso coração agradecido!
Visitas, culminando, dia entrado,
Com um lauto jantar e bem servido!
Sem querer ninguém ferir com desprimor,
P’ra o Victor, sua Esposa, o nosso Amor!

XVII
Há tanto que dizer, mas para quê
Se o silêncio também tem sua voz?
P’r’além do que se escreve e que se lê
Vale mais o que escondemos dentro em nós,
Ou algo em que se pensa, em que se crê!
Recordai vossos Pais, vossos Avós,
A vossa infância, a Terra lá ao longe!
Fazê-lo é reviver sempre MACONGE!

MACONGÍADAS – Canto Quarto

I
Desde então muitos anos já rolaram
Sobre nós mil desgraças se abateram!
Nenhum dos maconginos as narraram,
Nem tão pouco nenhuns as descreveram;
Ninguém com tinta e génio as relataram
- Dores e lágrimas que sempre bem esconderam – !
Por isso, uma vez mais aqui estou eu
P’ra contar como tudo aconteceu!

II
Sobre o reino caíra a letargia
Bem como já um certo esquecimento
Que se ia acentuando dia a dia,
Imbuído de saudade e sofrimento!
Faltavam novo fôlego e energia!
Havia que trazer-lhe algum alento!
Em hora benfazeja ele apareceu
E logo, logo tudo renasceu!

III
O Carlos que é também Victória Pereira,
Por achar ser mais chique e de bom tom,
Mudou o nome da família inteira
P’ra ser antes, porém, Mac-Mahon!
Após alguns anitos de canseira
Resolvera voltar a porto bom,
Trazendo em vez da capa e da batina
Um canudo – doutor em Medicina!

IV
E numa jantarada de homenagem,
Co’o Saraiva, Fontoura e o Rogério
O Carlos preparou esta mensagem
(Logo, ali, acatada bem a sério,
Achando boa ideia tal critério):
Que os festins seriam repetidos
E, de vez para vez, mais concorridos!

V
A par de tudo, havia que lutar,
Num desejo par’cendo veleidade,
- E muitos se deixaram arrastar,
Varrendo lés a lés toda a cidade,
Como vento veloz, sempre a soprar,
Num crescendo de força e ansiedade –
P’lo que era desejado e lhe faltava:
O Ensino Superior que a Huíla esperava!

VI
O Rei fora forçado a abalar;
Sua função, até, diminuída,
Mas logo que os arautos foi escutar
Tratou de se empenhar e, de seguida,
Ceptro real tornou a empunhar!
A conselhos sagazes deu guarida
E com a “malta fixe” a aprovar,
Em 70 o Saraiva nomeou,
Vice-Rei que tão bem desempenhou!

VII
Este, então, de mãos livres, já liberto,
Tratou de dilatar o reino seu!
Como era muito fino e muito esperto
Com mestria e saber o engrandeceu!
Criou à sua volta e deu bem certo,
Com um ardor que nunca feneceu,
Sobas fiéis a quem deu mil sobados,
Novos Duques, Barões são nomeados

VIII
Que, pouco a pouco, ergueram a nação!
A côrte até às damas foi aberta
Dando ao reino, afinal, maior expressão!
Quando a trica, que vem de parte incerta,
Começa a semear a confusão,
O melhor a fazer é estar alerta!
Em Luanda qu’ria o Rei a capital,
Decisão que, por certo, caiu mal!

IX
Devido à efervescência assim criada,
D. Caio, o Vice-Rei quis demitir!
Tal atitude, por todos criticada
E que ninguém havia de aplaudir,
Tornou a Academia turba irada
Tal bomba preparada p’ra explodir!
Se do Rei o intento fosse além,
O reino ficaria sem ninguém!

X
Porém, tudo acalmou quando o bom senso
Se sobrepôs àquela confusão!
D. César retratou-se e se bem penso,
O Vice-Rei, agia com razão!
Depois deste período triste e tenso
De mágoas se limpou o coração!
Fez-se, depois, festejo bem bonito
Preparado p’lo Farrica, no Lobito!

XI
Como era de prever, já de antemão,
Os velhos Professor’s foram partindo,
Depois, de geração em geração,
Novos valores se foram exibindo,
Como Mestres que deram sua mão,
Ao bom caminho a muitos conduzindo!
Maconge, assim, expandia sua glória,
Mais umas linhas de ouro em sua História!

XII
Quer minuto a minuto, dia a dia,
Tant’outras aventuras se viviam,
Soprando um frenesim na Academia
Que todos experimentavam e sentiam
Num culto de Amizade e de Alegria
- A regra porque todos se regiam –!
De lés a lés bramiam fortes ventos
Tornando os maconginos uns portentos!

XIII
A grandeza do Reino era exigente,
E forçava a criar a sua lei!
E foi assim que, quasi de repente,
O nosso amado Caio – grande Rei –,
Impulsivo quiçá, também prudente,
Movido por si próprio e pela Grei
Ordenou a feitura, co’atenção,
Da base de uma sã Constituição, (*)

XIV
Mas houve novo embate, desta feita,
Estando o Vice-Rei com toda a malta,
Pois a César tomara por desfeita
Que seu filho varão – tremenda falta –
Fosse afastado, longe da ribalta,
Se a morte, disfarçada de maleita,
Viesse p’ra cumprir o seu destino!
Mas seu filho nem era macongino!

XV
Depois de discussão e palratório
Achou-se que a D. Mário e a D. Silveira (**)
Só era permitido – obrigatório –
Concorrerem os dois, de igual maneira!
Acabou-se, por fim, o falatório,
Acabou-se, por fim, a chinfrineira!
Corrigiu-se, por isso, o que era mal,
Com decisão deveras curial!

XVI
Também nestes debates se assentou
Que além destes, tant’outros, se quisessem
O trono, que a celeuma levantou,
Podiam ocupar, desde que dessem
As provas que o passado alicerçou,
P’ra que, ali, as disputas logo cessem!
E, de novo, voltou a calmaria
Por todos recebida co’alegria!

XVII
Mas nem tudo era farra ou só Entrudo!
Havia muito mais do que aparência!
Forçoso era criar bolsas de estudo
Para os pobres de viva inteligência!
Ajudar sim, ajudar mesmo em tudo,
Suprindo, se possível, a carência!
Um lema a que Maconge não fugiu,
Um lema que, aliás, sempre cumpriu!

XVIII
Varrida por lufadas de bom ar,
Já se divisa enorme sementeira
Que o reino teimará em alargar,
Cobrindo, pouco a pouco, a terra inteira!
Outros, por exemplo, o Arrimar,
Mudaram-se p’ra China, tão estrangeira
E arrostando até com o que era mau,
São bem Maconge em solo de Macau!

XIX
O futuro, porém, fero e cruel,
Preparava p’ra nós, – oh quem diria –,
Disfarçado de sonhos e de mel,
Arrotando à mais vã democracia,
A partida tão vil que conteria
O travo bem amargo que há no fel,
Roubando (que tragédia que isto encerra!)
Angola Portuguesa – a Nossa Terra! –

XX
Depois o caos, a guerra, o desvario
Caíram sobre o povo macongino!
P’ra muitos, um caixão soturno e frio;
Mas outros, bafejados p’lo destino,
Apesar do tremendo desatino,
Puderam afastar o negro trio,
Talvez por ser diferente a sua sorte:
A Fome, a Peste, sem faltar a Morte!

XXI
A trágica diáspora nasceu,
Embora em todo o mundo, mais aqui!
Mas Maconge, porém, não esmoreceu,
Por tudo o que já sei e p’lo que vi!
Mais desgraça nos ombros se abateu
Dando tristeza que também senti:
Morreu o Rei, de dor e de revolta!
Mas paira a sua sombra à nossa volta!

XXII
A dor, a pouco e pouco mais esbatida
Parecia como um sonho de mau sono;
Era preciso prosseguir na vida
E encontrar quem ocupasse o trono!
E nas Côrtes de Coimbra é decidida
Escolha dum rei activo e não um mono!
Como uma só voz se levantasse
Pediram ao Saraiva que aceitasse
Todos queriam, num coro bem perfeito,
Que Saraiva, monarca fosse eleito!

XXIII
Este, porém, num gesto de humildade,
Não aceitou tamanha distinção!
Provou ser bem modesto e sem vaidade
Quando tomou tão sábia decisão:
Vice-Rei só, enquanto a sanidade
Da sua alma e corpo tem na mão!
P’ra governar o mundo macongino
Era capaz, sagaz, de muito tino!

XXIV
D. Roberto, talvez como excepção,
O trono de seu pai não quis tomar,
Declinando – que boa solução
Por tudo resolver, facilitar –
No outro candidato, a votação
Que a seguir se viria a efectuar!
Por isso, D, Saraiva volta à liça,
Figura alta, esguia e inteiriça!

XXV
Haveria um só Rei e mais nenhum!
Vice-Reis sim, assim ficou assente!
D. Caio era sempre o número um,
A figura de proa, o eminente!
Não existe acto algum, mas mesmo algum,
Que, em retrato, não esteja ali presente,
Parecendo que escutamos sua alma,
A todos transmitindo a sua calma!



(*) Nas Côrtes Gerais, de 1971, fez-se a aprovação da Lei Fundamental do Reino.
(**) D. Roberto Silveira já julgado e considerado Macongino Honoris Causa é, nas mesmas Côrtes, elevado à categoria de Príncipe Real.

Obs.: O Rei faleceu em 1977 e as Côrtes reuniram-se, em Coimbra, em 1978.